
Fica-se muito tempo na vida analisando o amor, a pessoa, o ambiente da pessoa, a família, suas conexões. Na verdade, há o amor. E quando se perde o amor, há o luto da perda. Luto não é coisa para velhos, que morrem de velhos (forma chata de pensar que ainda vejo na cara das pessoas). Luto é feito para qualquer um. É totalmente democrático e democratizado. E este é o começo de um filme que fala de perdas, luto, sofrimento, mas sobretudo de amor.
Não que tudo dê certo. Porém, as coisas também não são feitas pra darem sempre certo, obrigatoriamente. Há o amor que pertence ao luto, o desejo que nasce da amizade, que nasceu do luto. E há a mentira e a verdade, a dor que dá vida à mentira e as verdades que doem tão profundamente...
O filme é tudo isso. E tudo tão conveniente, gostosa e gulosamente bem empacotado com doses de realismo que não destoam do mundo, mas que que ainda são capazes de nos fazer imaginar que o amor poderia talvez mudar o mundo, se fosse talvez melhor canalizado ou distribuído.
Atuações impecáveis, num filme cheio de silêncios repletos de comunicação, de subtextos intensos. Gestos, falas, comportamentos tudo isso moderado – mas uma moderação que conduz a grandes intensidades, não se iludam.
E num mundo cada vez mais lotado de pessoas que não cabem mais nos lugares comuns, tipo “meninos de azul, meninas de rosa”, o filme mostra pessoas, amores, perdas e como cada um de nós luta com elas à sua maneira.
Resumindo: QUEM NÃO FOR, VAI PERDER!
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV

Ligação afetiva e amorosa com a comida. Pastelaria. Doces, bolos e biscoitos. Distância, saudade e escolhas. Família. Atingida em cheio....tumm...
Cada um de nós tem, da educação que teve e da sua cultura, coisas que adora e coisas que não gosta. Vive muito tempo com tudo isso até descobrir que pode encontrar uma forma de substituir o que não gosta da sua cultura noutras culturas. E isso é maravilhoso.
Em Portugal, as pessoas mais velhas diziam que as mulheres conquistavam os maridos pela comida. As pessoas conquistam as outras pela comida, fazem amizades, criam laços, encontram semelhanças e demonstram o seu amor mais profundo pelos outros. Pessoas que sabem cozinhar comida caseira e a fazem para os outros, são pessoas com um coração diferente e o seu amor é grandioso.
Eu tive a sorte de ter viajado um bom bocado. Umas das coisas que sempre me impressionou foi a forma como algumas pessoas mudam quando não estão no seu País. Parece que sentem que estão livres, soltas e sem nenhum julgamento ou lei que as proíba de fazer seja o que for. E o que revelam nem sempre é nobre. Mas outras aproveitam essa distância terrestre para tentar sair das amarras sociais e comportamentais que aprenderam e que não as fazem felizes. Essas parecem-me mais nobres. Sofrem muito mais mas tentam substituir “peças” que não lhes cabem por outras que naquela sociedade parecem mais aceites e usam essa força para si. Se salvam muitas vezes assim. Porque descobrem que existem pessoas parecidas com elas por aí elas descobrem uma saída. Isso as salva. E isso deve ser respeitado.
Um homem que toda a sua família foi uma avó que lhe passou todas as aprendizagens que ele precisava para saber viver feliz deveria ser um exemplo para as pessoas que se protegem atrás da família, amigos, favores, promessas, patrimônios, achando que estão seguras. Porque saber viver sendo apenas você e o que você sabe fazer, saber fazer bem e se possível ajudando os outros, são talvez as maiores nobrezas numa vida.
O filme é lindo com atores principais espetaculares. Nos mostra o que pode ser maravilhoso e terrível em cada sociedade e cultura. Nos mostra que não existe nenhum lugar ou cultura perfeita. Fala de escolhas difíceis, e de resultados bem diferentes para cada um dos intervenientes nessas escolhas. E escolhas de amor. Nem fala em escolhas de pessoas que apenas pensam no seu amor próprio. Fala de pessoas que genuinamente querem ser felizes e que não pretendem estragar a vida de ninguém, apesar de isso poder vir a acontecer. Fala de pessoas que querem viver a vida das outras quando deveriam viver a sua. Fala de segredos que achamos que nunca serão descobertos. Ai...este filme me diz muito. Acho que vos dirá também, se a vossa vida tiver o amor junto da comida, das escolhas difíceis e da saudade. Desejo que gostem e chorem como eu. Muitas vezes fazer uma comida é uma forma de dar um abraço nos que amamos e estão longe. E uma forma de amar quem cuida de nós.
Ana Santos, jornalista e professora
Informações sobre o filme
https://www.imdb.com/title/tt4830786/
Site da Saladearte
ok ana gostei mas a frase que sintetiza todo texto " amar quem cuida de nos'
Também gostei do filme, a delicadeza com que a complexidade da situação é contada nos faz ter empatia por todos os envolvidos, exceto pelo irmão da viúva, que cara nojentinho, rs. ADOREI o parágrafo de Ana Santos sobre o protagonista ter tido como figura materna e modelo sua avó, numa luz positiva, enquanto que na nossa cultura os "meninos criados por vó" são considerados mimados e indolentes!