
Esse filme te joga no chão. E olha, ele tem problemas de roteiro visíveis que afetam a ação do protagonista diretamente. Então vou logo aos problemas: em que País não é caracterizado conflito de interesses ter, na mesma pessoa, o atropelador de uma criança e o perito que vai exumar seu corpo, tentando descobrir se ela morreu de intoxicação alimentar ou do atropelamento propriamente dito? Outra: o roteirista transformou o médico num cara que pensa tanto que acaba atrapalhando a vida da humanidade inteira: o pai do menino que morreu, matou o cara que vendeu o produto que causou a intoxicação e depois de dias o médico o chama pra dizer “pode ter sido o atropelamento” (!). A mãe do menino morto e a médica que fez a autópsia estão logo na primeira fila dos maus tratos verbais e do fato do médico mudar de opinião a todo momento . A indelicadeza é incrível, o machismo também. Todos são ríspidos entre si e isso - nesses tempos bicudos - é uma enorme diferença cultural.
Mas tire isso de sua mente se você quer se ver circulando no sistema – a escuridão do filme dá falta de ar. A quantidade de falas inúteis, tais como aquelas que a gente ouve quando precisa entrar no sistema pra tirar uma certidão, um documento, um laudo, a falta de opção, a lentidão que te leva a presumir que uma coisa está acontecendo, quando existe outra coisa em curso – tudo nos conduz à sensação de encurralamento, à falta de opção de vida – e de morte também.
O filme é claustrofóbico e difícil. Mas necessário - apesar dos problemas que apontei. Por quê? Porque estamos ficando assim. Uma sociedade estranha, solitária, egoísta e culpada por ser egoísta. Um lugar onde ninguém está disponível, onde as coisas vão acontecendo e se amontoando ao nosso redor. Estamos virando reagentes e não agentes. E quem não souber a diferença entre um e outro PRECISA ver esse filme.
Ana Ribeiro, diretora de Cinema, TV e Teatro
Este filme me incomodou desde o inicio até ao fim. Injustiças, fome e pobreza profundas, interpretações díspares das situações, desgraça, morgue, mortes, prisões...meu estômago virou o filme inteiro. Sai sem saber colocar em palavras o que sentia. Filme escuro, triste, soturno. Música tocante mas dentro dessa energia.
Uma outra cultura, muito diferente da nossa. É muito interessante e importante ver filmes de outras culturas. No fundo, carregamos as mesmas questões e inquietações. As respostas são semelhantes mas com coloridos diferentes.
O que é certo de se fazer? Não se pode pensar muito no que é certo de se fazer porque pode virar muito errado e, em vez de remediar, piorar cada vez mais a nossa vida e a dos que nos rodeiam. O desespero perante a tragédia pode nos levar a fazer coisas erradas e escorregar em coisas erradas e mais erradas como se já nada mais pudesse ser controlado ou valesse a pena ser cuidado. Por outro lado, decidir fazer o que achamos certo pode ter um timing e também deve lembrar a premissa de que às vezes o que parece certo, vai destruir muitas mais vidas e tornar-se algo muito errado. A obsessão de fazer algo que temos de fazer pode virar uma cegueira obsessiva sem sentido.
Eu diria que é um filme a ver, mas se prepare. E, se estiver frágil, se prepare mais ainda. O filme destapa muitas feridas da vida.
É com grande carinho e felicidade que comunicamos o início de parceria entre o Circuito de Cinema SALADEARTE e o BUG Latino. Estamos muito honradas e motivadas para caminhar junto com quem faz tanto pelo cinema. Consultem o site do circuito de cinema Saladearte e venham ao cinema. O cinema pode ser um potencial influenciador da vossa felicidade...
Consultem o site da SALADEARTE:
Link do filme
https://www.imdb.com/title/tt6207878/
Ana Santos, professora e jornalista