“O PARADOXO DA COVARDIA “PATRIOTA”” e “Assustada” Bug Sociedade
- portalbuglatino
- 25 de fev.
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“O PARADOXO DA COVARDIA “PATRIOTA”” Bug Sociedade
Eu não sei bem o que pensar de um homem que joga uma cadeira em alguém tetraplégico. Todos sabem o que é ser tetraplégico? É aquela pessoa que perde a movimentação dos quatro membros, dos braços e das pernas, quando quebra a coluna ali pela altura do pescoço.
Quem joga a cadeira não se vê como o criminoso covarde que é, por qual motivo? Seria por acaso pelo fato de que Marcelo Rubens Paiva nunca se fez de vítima da circunstância, embora ele, propriamente ele, o fosse? Afinal, seu pai foi sequestrado, torturado, morto, tendo seu corpo desaparecido pra sempre, por obra dos emissários da ditadura, no Brasil. Mas não foi só. Marcelo também sofreu um terrível acidente, ao mergulhar e bater com a cabeça numa pedra, quebrando o pescoço. Mas tem mais. Só pode lidar com o fato de que seu pai estava morto oficialmente, com documentos comprobatórios – não esqueçam de que, sem documentos, uma pessoa não pode sequer movimentar a conta do cônjuge - 25 anos depois da morte de seu pai na vida real.
Quem jogou a cadeira deveria querer uma vítima clássica, mas Marcelo nunca apareceu na matéria do jornal da sua vida assim – ele é ativista, escritor, está no protagonismo da busca por justiça não apenas por seu pai, mas por todos os que, como o covarde que lhe atirou a cadeira em cima, atacavam casas, sequestravam, torturavam, matavam e sumiam com corpos, com a certeza de que nada ia acontecer.
Como agora, quando o grito de "Sem Anistia" fere nossa brasilidade. Sem anistia especificamente por qual motivo?
Com qual explicação alguém faz isso? Como se justifica algo assim?
Aí uma pessoa, vendo a coragem e a firmeza de caráter de Marcelo, naquele momento distraído no bloco de carnaval, ao invés de lembrar da Eunice Paiva, da forma como educou seus filhos, acha que deve lhe dar uma cadeirada em resposta ao... não sei responder. Covardia tem resposta? Uma pessoa assim, rastejante, deve se auto proclamar “patriota”... Mas isso é ser patriota em qual Pátria? O sucesso do livro de Marcelo, após o filme ter estourado mundialmente talvez seja um motivo, o respeito nacional atualmente por sua mãe Eunice... A inveja, a estúpida sensação de anonimato nesse mundo cada vez com mais câmeras pode ter motivado essa covardia?
Ninguém ao redor deste homem sentiu vergonha suficiente para lhe impedir? Você vê um cadeirante num bloco de pré-carnaval em São Paulo, vê com seus próprios olhos que ele não tem mobilidade funcional nos quatro membros e sente inveja, raiva ou qualquer coisa que não preste. Não se contenta com isso e tem a ideia de arremessar uma cadeira que bate em alguém, antes de ir direto à cabeça do Marcelo de surpresa. Já seria uma covardia enorme você desferir uma cadeirada em alguém inesperadamente, mas em uma pessoa com limites de mobilidade tão visíveis...
Como devemos nomear a ação de atacar alguém indefeso? Qual é o significado de ações dessa natureza, aqui no Brasil? Como alguém as pode aceitar?
Apenas imaginem o passo a passo. É de baixar os olhos de vergonha. É de vomitar.
Sem anistia.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
“Assustada” Bug Sociedade
Olho e leio as notícias e tenho a sensação de que estou a assistir a um filme de terror, ou talvez um filme de Frederico Fellini – roturas danosas na sociedade, involução de valores, instalando-se um medo em relação à forma como “os outros” podem reagir perante situações comuns e inofensivas.
O mundo está a empobrecer muito e muito rápido, socialmente. Donald Trump “bateu com a porta” ao entrar na Presidência dos E.U.A., derrubando alicerces de uma sociedade poderosa, destruindo moralmente instituições, ameaçando retirar apoios, recusando-se a respeitar todas as pessoas, independentemente do gênero, nacionalidade, status social. Tenho calafrios quando penso que Jair Bolsonaro desejaria fazer o mesmo ou pior no Brasil. Bem tentou. E os calafrios aumentam quando me dou conta que brasileiros “Bolsonaristas” estão votando nas eleições em Portugal – online - porque têm nacionalidade portuguesa por conta de pais e ou de avós.
Tá difícil. Já não dá para “fazer as mesmas contas e os mesmo raciocínios” que se faziam antigamente. Algo no jeito social de ser está mudando radicalmente. Assusta, preocupa.
Vendo uma pequena tartaruga dolorosamente atravessando o caminho de areia, depois a sua aflição na luta contra as ondas, com sua cabecinha se esticando para cima como que procurando saída e quem sabe respirar, andando em círculos, percebi que nós os seres humanos estamos fazendo quase o mesmo. Tentamos nos concentrar no que sabemos, vamos tentando manter a esperança, mas por vezes tenho a sensação que se aproximam tempos difíceis, desafiadores, diferentes, exigindo que pensemos “fora da caixa”, mas mesmo fora dessa caixa, desses hábitos. Vejo que lutamos e competimos muito uns contra os outros, temos medo que os outros contribuam para a perda das nossas oportunidades, não falamos dos nossos medos com ninguém, com medo de isso virar uma arma de arremesso. Nos vejo empobrecidos de vida, de pureza, de encanto, de leveza, todos mergulhados em fazer, fazer, fazer, tentando merecer, merecer, merecer. A vida parece ser outra coisa. Mas não mudamos. E me assusta muito o que estamos mostrando às crianças e aos adolescentes, que exemplos estamos dando.
Entretanto, o Carnaval já chegou em Salvador com os Fuzuê e Furdunço, e até dia 5 de março as preocupações do povo “fazem férias”. Depois logo se vê. Uns fogem da confusão, outros mergulham na folia e outros trabalham duramente nesta loucura de gente, de festa e quem sabe, de algum lucro. Os cantores e os músicos estão preparados como verdadeiros atletas – é impressionante o que fazem nestes dias, as horas que cantam e tocam, o calor que suportam.
Somos seres vivos que se preocupam por fases, como se o planeta, a vida e o nosso futuro pensassem dessa forma. Como se os problemas e as nossas contas aguardassem serenamente o “após Carnaval”, “após Festas Juninas”, “Natal” e “Réveillon”.
Meu Deus, meu Deus, como fazia falta uma lâmpada de Aladino e a possibilidade de ter direito a 3 desejos – pelo menos. Como assusta o que vem.
Ana Santos, professora, jornalista
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