Poesia na Colina
- portalbuglatino
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“POEMA CEGO E SEM BOCA”
“Não vejo e não tenho boca. Nem quisera tê-la.
Nem vejo, nem tenho boca. E não quero tê-la.
Sou um corpo negro, banhado entre as gotas,
Balançando-me entre as yagrumas
sem boca e sem olhos
deitada na grama alta dos canaviais,
à espera das minúsculas auras.
Negra é a pele da mulher que uiva muito mais
do que o olho dos furacões, ao lado de meu corpo
sem olhos, sem boca e sem corda
porém com uma memória intacta
que voa pelos céus
buscando ancorar sua dor nas margens de Gorée
ou para ir voando, cega como a minha alma,
sobre as planícies do Congo
até encontrar refúgio seguro embalado pelos ventos,
a chuva, o pardal e os salgueiros sem piedade alguma.”
Nancy Morejón
Cuba
“UMA BATALHA CHINESA”
“Separados pela colina ondulante,
dois exércitos mascarados
lançam intermináveis aleluias de combate.
O chefe, em sua tenda de campanha,
interpreta as ancestrais fúrias de seu povo.
O outro, reparando na linha do rio,
vê sua sombra em outro corpo, desconhecendo-se.
As músicas crescendo com o sangue
precipitam a marcha para a morte.
Os dois exércitos, como envoltos pelas nuvens,
adormecem apagando as contendas temporais.
Os dois chefes ficaram como que petrificados.
Depois contam as sombras que fugiram do corpo,
contam os corpos que fugiram pelo rio.
Um dos exércitos logrou manter
unida sua sombra com seu corpo,
seu corpo com a fugacidade do rio.
O outro foi vencido por um imenso deserto sonolento.
Seu chefe rende sua espada com orgulho.”
José Lezama Lima
Imagem: Andrea del Verrocchio
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