
“DEMOCRACIA, SEMPRE(!)” Bug Sociedade
Deveria ser uma afirmação, mas no Brasil, depois de um governo de ultra direita entre o louco e o abjeto, democracia conquistou seu ponto de exclamação - de alívio/entusiasmo. Ela venceu(!) e nós somos os maiores vencedores de todos. Ao contrário do hospício americano liderado por Trump, ninguém morreu – mesmo quando o governo nos expôs a todo tipo de armamento, tiro, desaforo, canhão, baionetas e violências. Setecentas mil pessoas no primeiro ataque – sem vacina, sem cuidado, sem máscaras. Setecentos mil caíram mortos, fulminados e a sanha nunca diminuiu.
Passamos por aumentos de violência verbal e física; passamos por gritos, humilhações. Mulheres tratadas como capachos pelo “rei do chiqueirinho”, entre “cala a boca” e “sabe com quem está falando”, fomos nos equilibrando e equilibrando todo o gênero feminino na mesma linha frágil e tênue da esperança de novas eleições – e ele as perdeu, mesmo por um fio, depois de todos os malogros possíveis e imagináveis para fugir da competição limpa e atacar o regime, as instituições – e nós. Nós e as trans tendo que explicar que ninguém se agarra nos banheiros femininos, que é só um xixi simples e já com um peso no coração – o que esses ultra moralistas fazem nos banheiros masculinos?
Há um ano, vimos o medo assombrar nossos sonhos de melhora coletiva – nada de só os ricos viverem, comerem, vestirem – termos que ser indivíduos agressivos, com gosto de sangue e abandono dos outros. Nada de generosidade, nada de sociedade, nada da existência do pronome nós, de uma vida em conjunto. Mas há um ano, a estupidez foi tamanha que, depois do medo e do pavor, veio a força e o vigor da esperança. E confiamos na eleição, no Governo novo, na ação dos ministros, nas Instituições, no Estado e na Democracia do Brasil. Muitos morreram pra alcançá-la em outros anos – Stuart, Zuzu, Herzog e muitos outros, sem nome. Muitos morreram nesses tempos – Bruno, Dom e Yanomamis sem nome, só com aquele corpo esquelético, a febre comendo, a fome comendo e nós – chorando na frente da tela da TV.
Briguei com um idoso mais idoso do que eu no mercado e ele foi o primeiro entre muitos que enfrentei, na internet. Nunca mais o silêncio. A Democracia ecoava e ecoa, pulsa nas veias – está viva em nós cada vez que a polícia mata mais um preto, mais um pobre. Ninguém é branco nesse País de miscigenados, mas alguns preferem se iludir – até irem para o estrangeiro e serem tratados como latinos - genes misturados de todas as cores, como somos. O ar altivo, abjeto, que dirige tudo o que for à prova de balas, cede à Democracia e nossa esperança não cede a nada. Somos o que estava além das camisas terroristas amarelas, do cocô e da falta de educação retumbantes, das rezas a uma espécie de Deus incompreensível, das bombas e da “selfie” pra ostentar o ser nocivo que se pode ser a partir das Redes.
Vencemos tudo. Vencemos os golpistas do exército e da Polícia Militar, a ideia estúpida de que o povo precisa de tutela e de que eles eram ideais para dá-la a nós. Vencemos os "marcianos" e muitos das Forças Armadas nos viram e acharam melhor não ajudar. Somos o povo brasileiro – aquele que como o Simba, do Rei Leão, ri do sofrimento porque vem da selva braba dos mortos pela fome, pelo preconceito, pela ditadura, pela pobreza, pela COVID. Misturamos heróis pobres na nossa história e podemos defender “Lancellottes, governos eleitos, “Lula”, “Xandão” e todos os que percebemos vivos em seu papel de salvaguardar a Democracia.
Aos generais que caíram em tentação, a vergonha de nos haverem tentado abandonar. Uma ousadia que requer justiça como resposta. Aos mandantes, mentores, financiadores, iludidos por palavras tolas, pelo poder sem o nosso apoio, sem o nosso voto: a cadeia. Nós nos devemos a liberdade, somos a construção da liberdade. E Janja, você estava certa: GLO era uma entrega que não poderíamos dar, sem perdermos a cara insubstituível da Democracia. Mulher é fogo...
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
“Contribuir para a Democracia” Bug Sociedade
Nunca esquecerei o dia 25 de abril de 1974 e o dia 8 de janeiro de 2023. O dia 25 de abril tem um enorme significado para o meu país, por marcar o fim da ditadura e o início da democracia. Eu era uma menina de quase 8 anos. E o dia 8 de janeiro por ser o dia em que o país onde vivo, foi capaz de evitar a tentativa de golpe, tentativa de terminar com a democracia. Eu tinha 56 anos. Dois dias na minha vida, separados por 49 anos. Jamais esquecerei as instituições e as pessoas que impediram que o golpe acontecesse. Jamais esquecerei quem teria adorado que o golpe fosse “consumado”. O dia 8 de janeiro tornou-se também um momento importante para conhecer melhor cada pessoa, cada vereador, senador, ministro, presidente. Para entender que muitas pessoas estão tão hipnotizadas que nem percebem o mal que fazem a si próprias – e estarão presas muitos anos - nem percebem o valor do patrimônio que também é seu – destruição dos edifícios institucionais de Brasília e das obras de arte - nem percebem que nada se consegue de bom com violência, mentira, degradação, maldade.
Tem muito trabalho a fazer pela frente. Sempre tem. Mas ontem foi um dia para nos orgulharmos do que foi feito em apenas um ano, do que foi impedido no dia 8 de janeiro e para termos esperança nos próximos anos. Vimos pessoas juntas, conversando, confraternizando e depois, uma cerimônia lúcida.
As democracias são colocadas muitas vezes à prova. Precisam estar atentas e permanecer inabaladas. Os acontecimentos do dia 8 de janeiro foram um conjunto de provas duras que uniram as pessoas, as instituições. Mas os que foram derrotados andam ao nosso redor. Sempre aguardando uma oportunidade. Estes acontecimentos nos avisaram de que devemos estar sempre atentos e atentas porque somos, os que lideram os países e nós os comuns cidadãos, responsáveis por manter o que foi alcançado e por alcançar o que é necessário – acabar com a fome por exemplo, já que existir uma pessoa, que seja, com fome no mundo, é algo imperdoável e vergonhoso para todos.
O país que queremos, no país onde vivemos e ou no nosso país de origem também dependem do que somos capazes de defender, de ser, de construir. Não somos apenas habitantes de um lugar, como se esse lugar fosse um hotel, um hostel, ou um resort onde vivemos a nossa vida inteira. Temos obrigações morais e políticas e o Brasil me alertou e estimulou para isso. A ele agradeço profundamente e por causa dele penso que sou uma pessoa melhor. Acho que Portugal sempre tentou me estimular para esse olhar, mas eu não percebi. O Brasil e suas dificuldades nestes últimos anos, que atingiram diretamente a minha vida, me fizeram perceber, na pele, no osso, no coração, que eu também tenho responsabilidades e que as minhas capacidades podem e devem contribuir para manter a democracia e melhorar a vida de todos. Obrigada Brasil.
Ana Santos, professora, jornalista
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