Concha com um público totalmente diferente. Estranhamente diferente, eu diria. A plateia – já que Simone não punha todos “sentadinhos”, como Caetano e Alcione fizeram – gritou tanto pra todos sentarem que até os dois, no palco, interromperam o que estavam fazendo pra colocar todos “comportados” de novo. Nota negativa de lado, mas ensinamento que precisa ser aprendido: Não dá pra ficar de pé lá na frente, gente. É falta de educação, ok?
Finalmente – UAU! QUE SHOW! Primeiro que Ivan Lins é um dos últimos gênios da geração dos festivais que está saudável e na ativa. Segundo porque eles formaram uma dupla de autor e intérprete que foi histórica na vida musical do Brasil.
A década de 80/90 foi mesmo memorável e ter feito parte dela e ver Simone no Canecão, o seu lugar, no Rio... sem palavras... poder lembrar disso ontem... nem sei dizer. Foram sucessos atrás de sucessos com obras primas que foram apresentadas agora pelas duas vozes juntas. A voz de Ivan veio sendo lapidada com o tempo. Quem lembra da primeira interpretação de “O amor é o meu país”, não viu nada de parecido. Menos força, muito mais suavidade, a voz dele com falsetes pra compensar os gritos do passado; pra ela os anos passaram? A voz poderosa, com a assinatura da quebra nas notas finais – as sustentadas. Simone pulou pelo palco, sambou, paquerou todo mundo, fez o que quis.
De alguma forma ela pareceu não reconhecer aquela plateia que, mais do que tentar se organizar sozinha, praticamente se reprimiu de colocar os braços para o alto e vibrar, de cantar alto, bater palmas. Nem em São Paulo se fica tão bem comportado assim num show histórico.
E eles cantaram o repertório incrível se não todo, quase. Eu não quis nem saber – mãozinha pra cima e voz solta na buraqueira - já que as músicas que Ivan fez pra Simone cabem certinho no meu contralto.
Uma pena que acabou rápido – coisa boa sempre parece curta. Eles voltaram, bisaram, Simone deu “cola” da letra da música, jogou flores e eu saí mais próxima do tempo em que eu e minha irmã saíamos pra ver Simone a cada temporada no Canecão pra vibrar, cantar e ter a sensação de estar viva. Igualzinho a ontem.
Ana Ribeiro, diretora de televisão, cinema e teatro
Simone me lembra tanto meus 18 anos, quando fui pela primeira vez ver um show de uma artista brasileira de sucesso em Portugal com meus irmãos e com os namorados e namoradas de cada um. Eu era atleta e queria muito ver a atleta de basquetebol do Brasil que também cantava e que nós sabíamos as letras todas. Quando Simone e Ivan Lins entraram me lembrei imediatamente desse momento passado. Ela também entrou pelo mesmo lado, roupa branca, o sorriso iluminado e o vozeirão. Parece que o tempo parou porque passado mais de 30 anos o momento se repetia. Senti falta dos meus parceiros do show dos 18 anos.
Em Salvador, as pessoas realmente querem participar tanto que podem chegar a incomodar. Umas pessoas decidem ficar de pé, outras sentadas e isso faz com que algumas pessoas comecem a falar bem alto em coro: “senta, senta”. Isso, quando Simone e Ivan Lins cantavam ou falavam da razão das canções, não foi muito bem recebido. Simone chegou a dizer que teria que falar mais alto, com cara pouco simpática. Ivan Lins chegou a usar as duas mãos para pedir “menos, menos”, com cara de incomodado. E a Concha Acústica, espaço exterior de espetáculos do TCA, tem bombeiros, funcionários, todos extremamente simpáticos avisando das regras e cuidados, lugares proibidos, etc. Mas quando o concerto inicia, é um corre corre para ver quem fica mais perto dos artistas. As pessoas nem pensam na irresponsabilidade e perigo desses comportamentos. Rolam celulares para gravar todas as músicas. Cada vez são mais raras as pessoas que vão aos concertos para ver, ouvir, sentir, dançar. Gravam, enviam, mas não sentem, não vivem.
Concerto intimista, saudosista. Tranquilo. Entre músicas criaram diálogos sobre momentos históricos das suas vidas, da criação das canções e sucesso dos dois e da grande ligação que ambas carreiras têm. Músicas e letras incríveis de Ivan Lins, uma voz poderosa e uma impressionante experiência em lidar com o palco, com o som do seu microfone, com o espetáculo, com os ritmos do público.
As letras das canções de Ivan Lins são maravilhosas e identificam as vidas de todos nós de uma forma inacreditável. Será que ele sabe o que se passa nas nossas vidas? Como ele sabe tudo isso? E como ele consegue dizê-lo? Porque isso é muito difícil.
Simone, a atleta, a mulher destemida, poderosa e intensa que surge nos palcos, nos faz muito bem. E salta e dança e se enrola em Ivan Lins. Continua uma fera. Faz uma dupla incrível com Ivan Lins por dar uma voz poderosa e feminina grave às suas canções.
Ana Santos, professora e jornalista