Poesia para as Garças
- portalbuglatino
- 15 de jan.
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“PANTERA”
(No Jardin des Plantes, Paris)
“De tanto olhar as grades seu olhar
esmoreceu e nada mais aferra.
Como se houvesse só grades na terra:
grades, apenas grades para olhar.
A onda andante e flexível do seu vulto
em círculos concêntricos decresce,
dança de força em torno a um ponto oculto
no qual um grande impulso se arrefece.
De vez em quando o fecho da pupila
se abre em silêncio. Uma imagem, então,
na tensa paz dos músculos se instila
para morrer no coração.”
Rainer Maria Rilke
“GARÇAS”
“Antes não havia garças. (Antes
dos ventos).
Restos de estrelas navegavam a noite
(a nuvem escura)
e se alvejavam em seixos e ossos.
À mesma noite
acrescentam-se sombras: eram as penas
e a plumagem.
As garças não eram feitas: surgiam. Leves,
feitas de vôo
(o vôo primeiro). Garças de asas
emendadas em asas,
as garças passam penhascos, além,
os prados cinza.
O verde inda é longe. Longe, as aves
adivinham a terra.
As garças descem (como atraídas) e
sentem a primeira
sede. A água compreendida pela
sede. Jamais
a informação da água: as garças gestadas
de puro vôo.
Nos ventos, o olhar enfastiou-se.
As garças buscam clarão de madrugadas
(ou de crepúsculos: nenhum sinal
por distinguir a cor das horas).
As garças pisam areias virgens
(imprimem sua chegada: a cruz aberta)
beiras de charcos, beiras de lagos,
restos de mar incendiados ao meio-dia.
Às vezes, as garças se animam
com o assovio dos ventos chamando
a noite. E dançam. Dançam o passado
cravado às asas. Nunca procuram
caminhos de volta: foram apagados.”
Maria Lúcia Martins




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