top of page

Poesia dos Rumores e dos Tempos Difíceis

ree

“PRETTY HATE MACHINE NINE INCH NAILS”

 

a Charles Bukowski

 

I.

 

“Os vizinhos

o observam com cuidado

o barulho de sua máquina

incomoda a todos.

 

É um vadio – dizem –

e voltam a suas vidas

confortáveis.

 

Ontem, por exemplo,

enquanto o empregado da companhia elétrica

o deixava sem luz,

com um sorriso os vizinhos

murmuravam acerca de sua vida,

de todas as coisas que deveria fazer.

 

Olhavam seu jardim,

potencial amazonas,

seu rosto de ressaca e barbudo

e seguiam orgulhosos

de não ter a vida que lhe coube.

 

É curioso.

Algumas vezes

ele pensa o mesmo.

Algumas vezes

acredita que eles têm razão.

 

Porém logo se embriaga e passa.

 

II.

 

Os vizinhos

voltaram a lhe dizer

que baixe o volume

do rádio

que não podem dormir,

que eles trabalham,

que não suportam

o barulho de sua máquina quando escreve.

 

Não lhes pode pedir que se calem.

Não pode pedir que não trabalhem.

 

Pede então

que vão

de uma vez por todas

à merda,

para grande escândalo da senhora

que o deixa rastejar

nessa casa.

 

Essa casa que sofre de tantos vizinhos.

 

A máquina segue soando como uma certeira

metralhadora

 

e é uma bela máquina de ódio.”

Felipe Granados

Costa Rica, 1976-2009

 

 

“EM TEMPOS DIFÍCEIS”

 

“Àquele homem lhe pedira seu tempo

para que o juntassem ao tempo da História.

Pediram suas mãos,

porque para uma época difícil

nada é melhor do que um par de boas mãos.

Pediram seus olhos

que alguma vez tiveram lágrimas

para que contemplasse o lado claro

(especialmente o lado claro da vida)

porque para o horror basta um olho de assombro.

Pediram seus lábios

ressecados e rachados para afirmar,

para erigir, com cada afirmação, um sonho

(o-alto-sonho);

pediram as pernas,

duras e cheias de nós

(suas velhas pernas andarilhas)

porque em tempos difíceis

acaso haverá algo melhor do que um par de pernas

para a construção ou a trincheira?

Então lhe pediram o bosque que o nutriu desde criança,

com sua árvore obediente.

Pediram o peito, o coração, os ombros.

E lhe disseram

que era estritamente necessário.

Depois lhe explicaram

que esta doação resultaria inútil

caso não entregasse a língua,

porque em tempos difíceis

nada é tão útil para atalhar o ódio ou a mentira.

E finalmente rogaram

que, por favor, se pusesse a andar,

porque em tempos difíceis

esta é, sem dúvida, a prova decisiva.”

Heberto Padilla

Cuba, 1932-2000


Imagem: Arnaldo Pomodoro


Quarta-feira, dia de poesia no Bug Latino. Dia de encanto. Venha se encantar com poetas incríveis.


@buglatino

A Plataforma que te ajuda a Falar, Pensar, Ser Melhor.


 
 
 

Comentários


ESPERAMOS SEU CONTATO

+55 71 99960-2226

+55 71 99163-2226

portalbuglatino@gmail.com

  • Facebook - White Circle
  • YouTube - White Circle
  • Instagram - White Circle
  • TikTok

Seus detalhes foram enviados com sucesso!

bottom of page