“NÓS CONTRA ELES É BEM MELHOR DO QUE ELES CONTRA NÓS” e “Algum aviso tem de te acordar” Bug Sociedade
- portalbuglatino
- 8 de jul.
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“NÓS CONTRA ELES É BEM MELHOR DO QUE ELES CONTRA NÓS” Bug Sociedade
Muitas vezes – talvez na maioria delas – a pessoa X tem a situação tão sob controle que confiante, decidida e suicidamente” abusa da sua vantagem – e por causa do excesso de confiança – põe tudo a perder.
Claro que a maior parte de nós sabe muito bem a deturpação que virou o Congresso Nacional quando a carreira política passou a se misturar com a carreira de "influencer". Sem transição, sem amadurecimento, nada – apenas quem tem muitos seguidores “se vende melhor" ao se unir a um partido qualquer – e há dezenas deles sem ideologia nenhuma, apenas alugando o espaço, como um AIRBNB legislativo – e sem seguro nenhum pra nós, os eleitores.
Apareceram as “anomalias legislativas”, claro. Ao invés de legislar, atualmente o que se quer mesmo é “aparecer, lacrar” – daí surgiram os “cortes de imagens para as redes sociais” com “verdadeiros shows”, só para o distinto público-eleitor-seguidor ficar lá, no scroll do celular, vendo, babando. "Brainrot". O “sangue e porrada na madrugada” das manchetes dos jornais invadiu o Congresso – e com isso, mais negociatas, mais dinheiro, mais "lobby", mais influência, mais dinheiro – falei mais dinheiro? – mais poder – o que é igual a cada vez menos direitos para o estimado eleitor brasileiro – o povo, o votante.
Com as negociatas, vieram também as chantagens e a moda do “dá ou desce” invadiu as votações. A imprensa de alguma forma colaborou ao “batizar” com nomes fofos a crimes. Crimes! Nasceram a “rachadinha” – diminutivo quase carinhoso para “crime de peculato”, orçamento secreto, ao invés de uso de dinheiro público sem transparência, emendas impositivas, ao invés de negociação com o poder executivo – e o respeitável público eleitor-seguidor “babando atrás” – o “rouba mas faz” saiu do lugar de murmúrio e passou a ser chacota - a moda agora é apenas roubar, desviar sem dar satisfação nenhuma ao dono do dinheiro – no caso, nós, o distinto público. Até que...
Bem, até que a mão pesou demais e a cada votação, a cada união e aliança entre deputados vinha uma “bomba” para o distinto público. Deputados votaram e agora recebem salário e aposentadoria ao mesmo tempo, houve o aumento do número de deputados – mesmo sendo vistos atualmente como inúteis e prejudiciais aos interesses do povo – no caso, nunca é bom reforçar – nós. Humilhação e ofensas descaradas contra mulheres – basta que sejam mulheres. Gritos, ofensas, palavrões, nenhuma preocupação com o povo. Nada de pensamento à direita – ofender virou sinônimo de direita. Fica todo mundo com medo e a discussão acaba com um ogro se gabando da sua grossura. Mais um corte – “põe nas redes”!
Aí suas excelências resolveram ameaçar o presidente, a presidência, a democracia, o regime presidencialista, tudo ao mesmo tempo, tanta a confiança. Afinal, os muito ricos estavam cada vez mais contentes – e vorazes – mas isso não importava porque o negócio era deixá-los satisfeitos. Nada de escola pública, nada de investir em educação, nada de saúde pública, hospitais, nada de aposentaria, nada de direitos trabalhistas. Vamos vender tudo, viva! E, de repente, uma mão, uma mente, um movimento, um público, um conjunto, uma aliança nasceu e se encaixou direto no coração do estimado público – que finalmente se sentiu distinto, estimado, verdadeiramente respeitável. Foi assim que nasceu a personagem “Hugo nem se importa” e nós – o respeitável público – passamos a esperar novos episódios inteligentes, cáusticos - e verdadeiros – acerca dos bastidores do Congresso, como esperávamos antigamente ao humor cáustico do "Programa do Jô, Planeta dos Homens ou TV Pirata".
Para alguns, da imprensa, “pegou muito mal”, mas para o respeitável público virou um espetáculo aguardado! Não é mais só o Supremo apitando faltas – nós entramos no jogo! Pelo menos agora, ao invés de contar mortos de COVID, em silêncio – não esqueci de ninguém – estamos disputando a bola da democracia – a honesta – com quem vier nas nossas canelas, ao invés de mirar na bola.
E o povo daqui é craque, excelências – não se esqueçam nunca disso. Chega de falta na gente e depois corrida pro”tapetão” - e olhando pro telão do estádio porque as redes precisam ser alimentadas!
BRASIL SIL - SIL - SIL! Porque nós contra eles é bem mais emocionante do que eles contra nós.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
“Algum aviso tem de te acordar” Bug Sociedade
Tento perceber o mundo. Tento perceber as pessoas. Tento escolher as melhores decisões. Tento me esforçar para dar o meu melhor em tudo o que faço. Tento prever o futuro. Tento aprender com tudo o que vivo.
Tudo isto por vezes me dá uma sensação de que está tudo bem, de que sou boa pessoa e de que a vida está melhorando e tudo vai correr bem. Isso me deixa satisfeita e feliz.
Mas de vez em quando a vida tenta me dizer, com calma e carinho, que não é assim. Um dia, no meio de uma ultrapassagem, com meu primeiro carro novo em folha – zero quilómetros – meu carro desligou. Deu para sair da situação bem, parei o carro e todos os homens que se aproximavam para “tentar ajudar” só falavam em erros que eu tinha cometido – “deve estar sem gasolina”; “não soube ultrapassar”; “desligou o carro sem querer”; “é muito jovem, menina, tem a carta há pouco”; etc. A marca do carro ofereceu-me 60% do valor da peça que tive de substituir, pedindo desculpas pelo defeito que tinham as centralinas dessa série. Não conheço nenhum daqueles homens que me disseram aquelas coisas injustas, por isso, imagino que continuarão a achar que aquilo que disseram era certo e irão repetir em outras situações semelhantes. Enviei uma carta à marca, dizendo que deveriam pagar 100% da peça, não 60%, e perguntando o que aconteceria se eu tivesse morrido nessa ultrapassagem. A resposta foi de que devia ficar muito feliz por ter os 60%. Tento guardar a ideia de que “ganhei uma vida” como os gatos.
Exemplos parecidos como este temos todos pela vida fora – vidas que ganhamos, como os gatos. Momentos em que nada daquilo que pensamos e aprendemos a interpretar combina com o que acontece na vida. Por isso, pensamos logo que não faz sentido, esquecendo que a vida não é algo que faz sentido, nós que tentamos achar sentido e ter uma sensação de termos influência e até controlo sobre tudo o que sucede.
A notícia da morte de dois irmãos, jogadores de futebol, num acidente de carro (um Lamborghini), com um pneu que estoura, durante uma ultrapassagem numa reta, carro que depois capota, depois incendeia e os dois irmãos acabam mortos e irreconhecíveis, talvez nos tente de novo avisar que nada somos, nada controlamos. A impossibilidade de viajar de avião para se apresentar ao clube, para mais uma temporada, indicação dos médicos devido à recuperação de uma cirurgia de pulmão, parece a vida a criar um atalho bizarro, como que a dizer que precisa mudar as circunstâncias, precisa criar uma forma de fazer o que “precisa acontecer”. Isso assusta, isso nos deixa sem chão, percebendo que o que tem de acontecer – seja lá o que for – vai acontecer. Como se a vida “criasse” uma situação em que estavam apenas os dois, “para os levar”. Um horror, mas por vezes é o que parece. Como aquele único sobrevivente da queda de avião na Índia. Como as pessoas que ficam chateadas por não ter podido ir naquele avião e depois aliviadas. A história de um homem que morreu atingido por um raio, quando chovia e ele estava fazendo xixi contra uma árvore – na Austrália. Aqui na Bahia são tantos os homens que fazem xixi contra as árvores a toda a hora que se tivéssemos raios com frequência, a cidade ia ficar só com mulheres...
Quantas situações terríveis acontecem na vida, e onde procuramos respostas claras, procuramos entender? Alguém errou, alguém fez uma maldade, o clima mudou de repente, uma infelicidade, uma coincidência. Tentamos encontrar algo que nos sossegue, que nos permita continuar a pensar que temos controlo sobre a nossa vida. Temos dificuldade em entender que a vida não tem lógica e quando alguém, como Diogo Jota e André Silva, dois seres humanos bons e corretos, morrem desta forma, ficamos muito confusos e com medo.
Esse é um momento importante de escolha no caminho:
1. escolhemos deixar passar os dias, passar a tristeza e a dor, e seguimos de novo na nossa vida, ilusoriamente dirigida por nós?
2. Ou, aproveitamos o aviso da vida, já que de novo parece que que nos tenta dizer que ela tem as decisões mais importantes - como por exemplo, quando vamos morrer e como - e fazemos uma boa reflexão, umas adaptações, umas reformulações, umas guinadas, umas mudanças?
Eu tento entender que não tenho poder sobre o dia em que vou embora e como vou embora. Tento entender que não tenho poder sobre muitas outras coisas da minha vida, e tento me lembrar disso todos os dias. Mas tantas vezes volto ao mesmo de sempre e aos mesmos esquecimentos, até que uma “fatalidade” acontece de novo. E preciso de novo fazer a mesma escolha: deixo passar e nada faço ou aproveito para aprender e melhorar algo em mim e nas minhas escolhas?
Clara Ferreira Alves, jornalista portuguesa, especialista, também, no Médio Oriente, escreveu sobre a forma como os mídia mudaram a sua forma de “cobrir” guerras. Fala que no Irão não teremos mais informações seguras e enviar jornalistas para lá é enviá-los para a injustiça e a morte e dar ao Irão forma de pedirem milhões em troca de reféns. Sabemos hoje que não é só no Irão que perdemos a possibilidade de saber informações “mais ou menos” verdadeiras. Fala na CNN e na sua decadência atual – durante a guerra do Iraque, por exemplo, eram os jornalistas de elite, que tudo conseguiam e a tudo tinham direito. Fala do “The New York Times”, da “Time”, “Newsweek”, “Sky News”, “Financial Times”, enfim, de todos os grandes que estão perdendo espaço e poder. Ela aponta a falta de dinheiro e a falta de interesse da população. As pessoas agora acham que “sabem tudo” rolando o dedo no feed do Instagram, do TikTok, do Facebook, do WhatsApp, Youtube, enfim, nos lugares onde cada um sente que as informações são “seguras”. Não pesquisam para saber se é mesmo verdade, e sem dar conta, elas mesmo funcionam como distribuidoras de mentiras ao postar no seu feed, ao comentar nas conversas de amigos. Falta aprender a ser filtro, a ser alguém confiável, a não se deixar dominar pelo “ambiente”.
Uma tragédia tão absurdamente triste e desoladora como a morte destes dois jogadores de futebol portugueses, virou uma febre de vídeos e notícias na internet com muita gente tentando ganhar dinheiro com visualizações. Virou uma forma de atingir Cristiano Ronaldo, por não ter estado no enterro. Virou uma forma de tentarem demitir Luís Diaz – colega de Diogo Jota no Liverpool – só porque não foi ao enterro e colocaram a circular imagens dele a dançar, sugerindo que estava a dançar em vez de estar no enterro. Quando ouço a expressão “pior que bicho”, percebo que está errada porque não somos piores que bichos porque os bichos não são maus. Nós somos, só nós somos. Um dia ainda teremos faculdades em que os professores serão os bichos e os alunos, os humanos.
O nível de jogo de palavras, mensagens, veneno, que nós humanos conseguimos reproduzir, é preocupante. Mais preocupante quando funcionamos como multiplicadores de coisas erradas achando que estamos a fazer algo engraçado ou corajoso. As nossas desgraças têm de ser respeitadas por todos, mas as desgraças dos outros significam oportunidades de nos enriquecer.
Podemos criticar, apontar e até nos distanciar dos que fazem as coisas horríveis, mas enquanto não entendermos que precisamos ajudar a parar essas pessoas, precisamos fazer a nossa parte dando a cara, sem perceber estamos a piorar tudo, sem saber estamos a aplaudir os venenos, sem saber estamos a desperdiçar o nosso tempo e a nossa vida. Sem perceber, estamos a ajudar a desenvolver ódios, invejas, sentimentos terríveis que proliferam como bolor, podridão.
No dia escolhido pela vida para irmos embora, o arrependimento vai aparecer, vamos finalmente perceber tudo, dizer que “se soubéssemos teríamos feito melhor”. E adianta?
Ana Santos, professora, jornalista
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Terça-feira, dia de escrever sobre o que acontece no dia a dia. De crítica, de conselhos, de admiração, de espanto, de encontrar caminhos melhores para todos.
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