A barbaridade do dia 08 de janeiro não nos pode cegar para o fato de que, por diversas vezes no curso dos quatro anos de governo Bolsonaro houve sucessivas tentativas fracassadas de golpe – todas devidamente colocadas em banho-maria, até a explosão do 08 de janeiro – indesculpável, inqualificável.
Nessa série de reportagens que forma um DOC em três partes, a TV Fórum tenta sintetizar a consequência da barbárie, da ignorância e da manipulação de pessoas. E é arrepiante. Principalmente porque todos vimos isso acontecer. Os dias 7 de setembro, a construção de uma incitação à violência permanente, a banalização da morte que se agravou na pandemia, a humilhação das mulheres, a ideia de que a servidão era o nosso melhor lugar social, o menosprezo às nossas questões raciais e de gênero – era uma ode à violência, às armas, a agressividade.
O resultado bem se viu – o horror. Vi com medo e asco cada passo. Antes presa em casa por causa da COVID, depois tentando enfrentar o medo de que as trevas voltassem. E foi por um triz.
Os DOCs não têm nenhum tratamento de arte. São crus, como uma reportagem que se preocupa em retratar o momento. A mensagem, bem clara para todos: ditadura não tem enfeite. É bomba, tiro e morte para os que não concordam com a ideia de que haja alguém que decida por todos. Que mande em todos.
Asco ao terrorismo.
Apareceram heróis como Flavio Dino e Alexandre de Moraes que defenderam a democracia com unhas e dentes, apareceram ameaçados como Randolfe Rodrigues, os inteligentes como o presidente Lula, os dignos como os ministros do Supremo, que acorreram em peso, os que chegaram com a “mão amarela” de vergonha por terem apoiado a escalada de violência no curso dos anos. Mas vieram todos e isso era o que importava.
Nunca o Brasil viu tanta violência e destruição e nunca o nosso voto foi tão precioso para consagrar a democracia, a nossa vontade. Nunca senti tanta vergonha por ver brasileiros como eu ajoelhados e rezando para agradecer a destruição, o espancamento, a covardia, a falta de princípios, de ética, o cocô no chão do palácio, a falta de um “eu” (self) capaz de se auto impedir, de desconfiar da existência de mitos quando todas as linhas sempre apontaram para mistificadores históricos, num tipo de credulidade cega, infantilmente ignorante.
Cada momento do documentário conta e ele deve ser visto por todos, nas escolas, nas igrejas, nos empregos, para que nunca mais se repita. Para ser entendido, discutido, interpretado. Talvez assim, a ação do voto não seja vista como forma de amor ou de protesto quando é uma decisão madura para o bem do País. E andamos muito para trás pela ilusão do protesto pelo voto. Ficamos sepultados no mundo como os que não são bem vindos e nem assim, os ignorantes caíram em si. Nem assim perceberam que o Brasil andava sozinho e que no mundo globalizado isso é simplesmente impossível, já que andar sozinho é o mesmo que ser abandonado.
Claro que ainda existem alguns milhões que têm vontade de colocar o celular na cabeça, chamando os marcianos, de matar, violar a grandeza de símbolos da democracia. Mas que eles, acima de tudo, tenham medo da justiça porque o Brasil se acostumou a salvaguardar o poder e os poderosos. Mas agora chega.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
ATO 18, um documentário com dois episódios resume os acontecimentos do dia 8 de janeiro de 2022. Uma forma diferente e informações novas. Tem ainda muito por fazer para descobrir responsáveis, mas mesmo assim, a lista de culpados já é grande. Narrativas manipuladoras, mentiras combinadas, segredos fechados a sete chaves, hipocrisia, tudo isto em pessoas que tentam convencer os investigadores que são seres limitados, distraídos, inocentes. Não fizeram nada, dizem nas suas declarações. Tentam retirar do contexto todas as provas, todas as declarações, todas as conversas por celular. Tudo se vai tornando cada vez mais óbvio, mas nunca entendem, nunca fizeram nada.
O Brasil não é fácil, tem uma complexidade geográfica, humana, social e ideológica enorme. Muitas instituições, muitas organizações, muitas forças, muitas autoridades, muitas narrativas. Uma cebola com imensas camadas, uma cebola gigantesca em que cada camada parece um país completamente diferente do país da camada seguinte.
Desejo muito que tudo seja esclarecido e todos os responsáveis, paguem pelo que fizeram. Mas se a vida é movimento, o Brasil e todos os que seguem Bolsonaro e suas estratégias a todo o momento são muito mais movimento. A justiça está sempre na “cauda do trem” que está sempre quase a ser apanhado mas que sempre foge. O trem dá gargalhadas, faz chacota, ganha dinheiro por todos os lados, prega a religião, a família, a pátria. Prega apenas.
Um documentário importante. Assista, divulgue e se prepare. O futuro vai exigir que estejamos mais atentos.
Ana Santos, professora, jornalista
Sinopse: série documental sobre os atos golpistas do dia 8 de janeiro, produzido pela Fórum Filmes, com direção do jornalista Luiz Carlos Azenha, e financiado pela comunidade da TV Fórum.
Link do episódio 1 - ATO 18 – o golpe contra Lula – episódio 1
Link do episódio 2 – ATO 18 – o golpe contra Lula – episódio 2 -Festa da Selma
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