2 Contos: “NA CASA DO SENHOR NÃO EXISTE SATANÁS” e “Clara Pinto Correia, obrigada!”
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Conto “NA CASA DO SENHOR NÃO EXISTE SATANÁS”
No Congresso Nacional, Satanás mandava e desmandava. Tomava o corpo de tantas “Excias”, que nem Deus queria se meter no assunto. Mas existiam alguns políticos onde Satanás se projetava. Era uma loucura o que eles faziam com o “Diabo no corpo”: orçamento secreto que ia direto pra buraco do inferno e nas contas bancárias secretas de alguns políticos; falsos discursos – aí Deus mal começava a ouvir e era tanta mentira, tanta mentira que, de cansaço, Ele cochilava; os Demônios salvavam os do mal, queriam prejudicar os que prestavam; a roubalheira parecia espraiar-se naquele País de tamanho continental. E o povo ficava só olhando – não tinha vontade de fazer nada. Só podia ser encosto!
Votação de cassação de mandato, com deputados bandidos, condenados, presidiários por todos os lados. Havia sobrado um por ali, cujo pecado tinha sido gritar a verdade na cara dos poderosos. Começa a defesa, ele toma a mesa, apanha um monte de porrada, é retirado à força.
- Deus ta vendo! Diziam os bandidos. Mas quem via mesmo era ele – o do Mal, o Belzebu lazarento, o Satanás – mal disfarçando a voz para hipnotizar multidões. “Se Deus manda, nós obedecemos”! olha o castigo! Olha que quem planta colhe!
E assim iam passando malefícios para os indígenas, para os cidadãos, para os pobres e ignorantes, enriquecendo cada vez mais; enchendo seus bolsos de dinheiro público, do povo miserável que eles só lembravam na época da eleição. Compravam votos, distribuíam emendas orçamentárias, bolsos sempre cheios.
Deus olhava aquilo, olhava... Uma hora, perdeu a paciência. Chamou logo Jesus e os anjos:
- Acordem o povo. Aquele tal, de São Paulo, que está dando fim ao patrimônio público. Pegue aquele lugar e encha de chuva, vento, problemas. Quero que caia a carapuça do “Mané Diabo”, entenderam? E vocês vão passando assim de estado em estado. Essa coisa de preconceito tem que ficar à vista de todos. Lá em Santa Catarina peguem e ponham na vitrine cada crime.
- Que vitrine, Meu Pai?
- Na TV, Menino! Ponha na TV. E vá mostrando o que os que se acham divinos desviam de bens, de petróleo, de dinheiro. É tanto, tanto... mas eu quero que todos vejam, todos saibam. Cada roubo bem à vista de todos. Quero que dê polícia. Eles têm medo da expressão “TOC, TOC, TOC”. Faça esse som aparecer em todos os encontros dessa gente! Quero que eles durmam e acordem com medo da Polícia Federal batendo à porta. Ponha guardiões. Tem um careca lá muito bom. Ponha ele com olhos de lince e balança da justiça calibrada para pegar os ímpios! E ali, ao lado deste, tem um gordinho. Olhos de lince também! Pegue a espada de Gabriel e Rafael – aliás, nem pegue nada – chame os anjos e ponha os dois com espada em punho, defendendo os direitos que estão sendo roubados por essa turba de gnomos das trevas há décadas! Séculos!
Por último, falta o principal: Chame o povo. Coloque os anjos de clarim nas mãos chamando o povo. Ponha todos na rua. Me ouve bem, Meu filho? Ponha o povo na rua apontando o dedo na cara de Satanás. E garanta a todos: Eu estou olhando.
- Mas Meu Pai, muitos acham que sua própria religião é que conduz a verdade.
- Sim, são os atrasados. Mas eles podem ser tocados pela verdade, mesmo quando os metralhinhas nojentos caminham pelo Congresso, votando para salvarem-se.
- Como vão discernir Meu Pai?
- Medindo os fatos, os fatos – OS FATOS! É importante para o País soltar bandidos ou planejar o combate aos criminosos? É importante, salvar o território indígena e com isso diminuir a agressão à natureza ou deixar os fariseus queimarem tudo, plantarem tudo com veneno? O que é melhor para a vida e para o futuro? Escutem a Minha Voz – se não houver mais clima, se todos morrermos, qual foi o sentido de Você mesmo ter nascido, Filho de Deus? Se os indígenas forem expulsos da terra, quem dela cuidará? Os Fariseus? Os falsos profetas?
- Mas eles se dividiram.
- Não. Porque eu dou a todos o meu amor e ao amor só cabe correspondência. Não se pode amar a Deus matando, roubando, desviando, mentindo, enganando. Esse é o fato. E aquele que se diz pastor e rouba as ovelhas, ao invés de guardá-las precisa pagar o preço, ainda que ele seja caro porque o Fariseu sabia que sementes tinham e quais plantaria. Portanto, aqui nesta terra, Satanás não pode ficar. Ele e seus demônios que saiam por onde entraram. Não haverá pedra sobre pedra! Nem Hugo, nem Artur, nem Aguinaldo, nem Paulinho – Todos hão de Temer os olhos argutos de Deus.
- O recado Pai, então é:
- Digam que Deus ta vendo e que na Minha casa, na casa do Senhor não existe Satanás. E chame o povo porque o cheiro de enxofre vai ficar na rua, quando todos se reunirem. “E se saia, que o Teu corpo - o corpo do Cristo - há de limpar essa lama.
E Jesus e Seus anjos desceram num domingo.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
Conto “Clara Pinto Correia, obrigada!”
No dia 9 de dezembro de 2025, a minha empregada encontrou-me morta. Já tinha partido há uns dias, mas ninguém sabia. Agora que ela me encontrou, vai começar o circo. Vai ser divertido assistir de camarote a tudo.
Sei perfeitamente quem vai lamentar minha morte, quem nada vai dizer e quem vai ficar muito aliviado. E aqui falo de todos os que nunca me engoliram. Faz parte. Eu fechei a loja, terminei o expediente, vou para outras bandas. Há uns anos ainda tinha energia para mudar de país, mas agora parto de vez deste Portugal dos pequeninos. Me alegra ir. Aqui já deu.
Estes dias, morta, sem ninguém saber, me deram tempo para pensar em tudo o que passou e em tudo o que vai passar a partir do momento em que os olhos da minha empregada me encontram sem vida. Tenho pena dela porque não é uma coisa bonita de se ver, mas foi melhor assim. Ia me custar muito mais que uma das minhas irmãs tivesse de ter essa experiência desagradável.
Olho para trás e acho incrível o que fiz. Percebo com mais nitidez que Portugal não tinha nem tem energia para uma carga de bateria como a minha. Os fusíveis portugueses queimavam de cada vez que eu trazia algo novo. Até a minha capacidade de dizer a verdade e de arcar com as verdades menos nobres minhas. E ainda tem a minha capacidade de os desmentir, de forma suave e clara. Fiz de tudo para o meu povo avançar nos pensamentos, nas ações, diminuir os preconceitos. Mesmo as pessoas que me odiavam, que me consideravam louca, sei que melhoraram muito com a minha “assinatura”. Claro que elas não vão dizer isso nunca. Mas com os anos, se não morrerem tão cedo quanto eu morri, quem sabe percebem como fui boa nas suas vidas. Era e é bom para elas tudo o que fiz e deixei.
Entenderam sempre mal, sempre com censura, sempre com má cara, tudo o que trouxe de novo, tudo o que sabia que era necessário para o nosso país caminhar.
É que o ranço demora a sair e as pessoas não gostam nada que uma mulher lhes aponte o ranço, as manchas na roupa, o mau cheiro, dos seus pensamentos e ações. Preferem manter um país enclausurado, à ousadia de ver o mundo, de melhorar como pessoa, de voar junto com todos os que te rodeiam. Preferem manter tudo escuro e tradicional, ao contrário dos nossos vizinhos espanhóis que procuram o duende dentro de si, duende com que Frederico Garcia Lorca os provocou. Eu provoquei Portugal com o duende, do meu jeito, mas eu sou mulher. É difícil uma mulher ser ouvida no meu País. Algumas só depois de mortas. Quem sabe? Ou noutras vidas, noutras gerações futuras, talvez apareça a resposta.
As pessoas têm vergonha da sociedade quando estão pobres, quando estão sozinhas, quando assumem pensamentos disruptivos. Eu fui tão incómoda que quando puderam, e puderam, fizeram tudo para me excluir, me isolar, me barbarizar, me secar publicamente.
Teriam me matado totalmente em vida, se não fosse a ajuda e apoio das minhas irmãs, anjos da minha vida.
E os mesmos que secaram minhas fontes de vida, sem sujar suas mãos, aparecerão agora cheios de elogios, cândidos, amorosos. Tiraram a peça do tabuleiro, em vida, agora retiram a peça do tabuleiro e do jogo.
Docemente chegará a sua hora de serem retirados do tabuleiro e depois retirados do jogo. E da história.
Se alguém perguntar por mim digam-lhe que fui visitar Clarice Lispector. Temos muito para conversar.
Também já marquei um chá com Violeta Parra porque quero que me conte como conseguiu fazer aquela maravilha da sua autobiografia em “Décimas de Violeta Parra”. Também quero bater um papo com Mercedes Sosa.
Mísia, Amália Rodrigues, Sophia de Mello Breyner, Maria Teresa Horta, Paula Rego, vou preparar um almoço sem horário para terminar.
Inês de Castro, não me escapas. Tenho tantas perguntas e tanto tempo para lhe ouvir. Ai meu Deus, como vai ser bom!
Para os que ficam, me desculpem sair cedo, mas isso aí já não era interessante. Aqui como podem perceber, ainda nem começamos.
Ana Santos, professora, jornalista
Imagem: Arnaldo Pomodoro
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