2 Contos: “COP30 PRA QUÊ?” e “O sonho de assistir LucaRio jogar”
- portalbuglatino
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Conto “COP30 PRA QUÊ?”
E se o planeta mudar mesmo de plano, de energia? Ao olhar para a quantidade de problemas à sua frente, todos aparentemente insolúveis, limpou o suor da testa e incorporou mais um – o aquecimento global.
- Que calor é esse...
Olhava a terra reagindo ao temporal – sempre aterrorizante – e via o calor do sol querendo levantar os cabinhos dos filhotes de tomateiros que havia plantado. Mas havia plantado mais do que tomates porque semeava palavras em toda parte. Falava pelos cotovelos, sua mãe sempre dizia. Lembrou-se de Vitória, sua amiga, daquele abraço de criança que é uma delícia, lembrou-se de seu problema com os meninos, “que tinham problema com o cabelo dela”.
- Por que os meninos fazem isso, hein? Desde pequenos incomodam, provocam. Dá uma raiva...
- Eu reclamei com minha mãe e ela foi lá na escola. Não adiantou nada, mas ela foi – disse Vitória.
- A professora nem se meteu. “Nem te ligo” ... mas obedeceu a minha mãe, que foi reclamar lá no Conselho Tutelar. Porreta essa minha mãe, viu? Na mesma hora, querendo ou não, os meninos “foram calados”. Bem feito...
Nariz colado no vidro da janela, vendo a chuva cair e pensando o que a professora poderia pedir na prova na geografia...
- A COP30 foi todinha de ambiente, né? Por que as pessoas não dividiam logo o que cada um tinha pra fazer, que nem em trabalho em grupo, na escola? O tal do Trump matou essa aula e o governador do Rio matou logo todos os alunos da escola – parece mentira que aquela gente toda estivesse mesmo morta, mortinha da Silva... O governador nem piscou, quando mandou a polícia fazer aquele sofrimento todo, aquele morticínio.
Viu pela Tv, de rabo de olho, que vinha mais tempestade lá para os lados do Sul.
- Ai, gente... esse Paraná não vai aprender nunca que eles precisam se juntar e cuidar daqui do Brasil todos juntos? A minha pró explica coisas que falam da força do grupo, da união, da proteção que muita gente dá, mas na hora que todos precisam de todos, cada um só pensa em si. Igualzinho lá na escola...
Viu pela janela o caminhão do lixo passar e viu também aqueles meninos que via sempre – ali, correndo atrás do caminhão, pegando uma coisa ou outra: latas, papelão.
- Eu podia pedir um pão pra minha mãe e dar pra eles... ou mesmo descer ali porque eu acho que o vizinho abandonou o cachorro dele no quintal e foi embora.
Achou um pão, passou manteiga e deu pro menino da rua que era seu amigo. Aproveitou e pediu ajuda pra pegar o cachorro. O quintal ficava lá embaixo... Sabe fosso de castelo? Parecido – pensou.
O cachorro era só pele e osso, daria pra contar quantos ossos ele tinha no corpo de tão magro... pegou aquele esqueletinho magro, agarrou o bicho pelo pescoço, pelos bracinhos e veio subindo a escada – difícil. Chegou em casa, deu ração, um bom banho e quando ouviu a tranca do portão se abrindo pediu ajuda ao céu porque a mãe poderia fazer qualquer coisa:
- Até se estressar!
A mãe viu “a baixa” nos pães, na ração do cachorro. Viu o “Bone” dormindo com os ossos aparecendo. Já tinha uma almofada embaixo do corpo.
- Mãe, eu posso explicar. Eu tava ali no quarto estudando inglês e pensando em guerra, briga, homem batendo em mulher, o pessoal dos Comandos maltratando as pessoas e fui ficando cada vez mais triste porque não podia ajudar em nada, mesmo vendo o mundo piorando. Nessa, eu vi os meninos tentando achar alguma coisa pra comer quando passou o caminhão do lixo e pra piorar, ouvi o Bone latindo. Chamei ele de Bone porque Bone é osso em inglês, sabe? Bem, eu achei que assim poderia também dar uma treinada no inglês, ao mesmo tempo em que dava uma pequena ajuda porque eu não sei consertar meio ambiente, nem facção, nem bandido, nem polícia...
O abraço da mãe a interrompeu. Mais do que os políticos, ela, uma menina à toa, pequena, fazia muito mais do que uma enorme quantidade de adultos. Antes de falar mal, agia, antes de xingar e provocar, ajudava. Ela era apenas uma menina boa, ainda não tocada pelo egoísmo da vida, que iria ensiná-la a dividir suas migalhas.
- Vamos ter que lanchar comendo menos pão. O Bone pode ir ficando, mas só até você arrumar uma casa de gente amiga que queira ele, certo?
Se cada pessoa levasse sua gotinha no bico... Nem precisaria da tal COP30...
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
Conto “O sonho de assistir LucaRio jogar”
Cara, eu amo futebol. Vocês não estão entendendo como eu amo. Amo tanto que me lembro dos golos de Zico, de Pelé, dos “mísseis” de Roberto Carlos, da arte de Kaká, dos golos suaves de Ronaldo “Fenômeno”, da confiabilidade de jogo de Rivaldo, de Branco, e de Raí, do espetáculo de Ronaldinho Gaúcho, para não falar de centenas e centenas de jogadores inacreditáveis que o Brasil teve, tem e terá. É uma lista sem fim de jogadores que fazem do futebol algo mais, onde parece que a bola tem motor, ou é um drone-bola, em que o jogador parece ter uma torre de controle no seu cérebro para ver o jogo e para ver o que quer fazer acontecer – e que ainda ninguém viu.
Eu, aqui, no meu sítio, na serra gaúcha, bem isolado e feliz, fico mais feliz na hora do meu futebol, assistindo pela televisão, todas as noites. Agora, atualmente, minha paixão tem sido um jogador chamado LucaRio. Nossa, que jogador maravilhoso. Veio do Santos, jogou pelo mundo, incluindo o Barcelona, com Messi, Iniesta, Xavi, e muitos outros jogadores incríveis. Um craque. Faz o que quer da bola e dos adversários. Quer dizer, fazia. Dizem que não faz mais. Eu não leio jornais nem tenho redes sociais, mas dizem que ele já não é mais essa maravilha. Dizem que engordou, que só gosta de festa, que treinar não é com ele, que tem lesões com facilidade. Sobre as lesões até dizem que inventava e inventa algumas lesões para não treinar nem jogar alguns jogos. Está ficando mais velho e dizem que é quando o jogador envelhece que se vê como ele se tratou em jovem, como se cuidou. Até dizem que fazia farras de noite, quando estava no Barcelona, e que no dia seguinte ia treinar ou jogar. Dizem que na Arábia Saudita, fazia altas festas no seu iate, em zonas onde ninguém pudesse ver ou controlar. Dizem tanta coisa. Mas eu não acredito em nada. Não pode ser! Um craque de um país de craques, com tanto talento, não pode fazer tudo isso. Não é possível! Eu nunca o vi jogar ao vivo. Quero ver, antes de me ir embora deste mundo. Soube que voltou para o Santos e decidi que é o momento.
A minha vida se complicou um pouco porque já não sou jovem e precisei fazer uma cirurgia para colocar uma prótese na coxa esquerda. Tive que adiar um pouco mas agora que estou bem é o momento. Ele vai com o Santos, jogar no Flamengo. Momento ideal. Ver LucaRio, no Maracanã, jogando contra o Flamengo. O que se pode pedir mais?
E assim, eu, uma pessoa “doida” por futebol, decidi comprar uma passagem de avião para O Rio de Janeiro, pela primeira vez na minha vida. Marquei a passagem, marquei hotel, tudo certinho. Comprei roupa nova, sapatos novos, uma mala, uma mochila, uma máquina fotográfica.
Morri de medo na viagem de avião, mas tudo acabou bem. Deixei tudo no hotel, tomei um banho, comi e parti para a maior experiência da minha vida, aos 70 anos.
Cidade grande é diferente. As pessoas são diferentes, o ritmo delas também. Cansa a gente. Cheguei ao estádio. Que sítio gigantesco! E quanta gente, meu Pai. Parecem formigas, tantas que são!
Encontrei meu lugar e me preparei para assistir ao jogo. Muito barulho, muita festa. Como tudo é tão ruidoso por aqui. E longe. Não sei se vou conseguir tirar fotos do jogo e do LucaRio.
Começa o jogo. Eu só tenho olhos para LucaRio, mas achei ele lento e mais pesado. Ele era tão magrinho quando eu o via jogando no Barcelona. Nem parece o mesmo. E fala muito com o árbitro. Não parece falar, parece mais refilar. Quer a bola a todo o instante, mas não faz nada com ela. Humm... Nossa, ele quer tanto estar só com a bola que até foi chutar a bola que o goleiro ia colocar em jogo e depois ficou chateado porque o colega não lhe passou a bola. Vixe, que menino amuado. Egoísta. Desagradável. Puxa, que triste isto.
Hiii, não acredito. Vai ser substituído. E não quer ir. Xiii...está fazendo cena na saída do campo para todos verem que não gostou de sair. Mas que mico meu Deus.
Eu se tivesse feito isso em menino, minha mãe não ia deixar não. Acho que ele não aprendeu em menino as coisa certa e pelos vistos ficou com as coisa toda errada em adulto. Com minha mãe tu não ia ter essa sorte não.
Terminou o jogo, o Santos quase empatava no finalzinho – sem LucaRio – e eu fiquei triste. Não fiquei triste com LucaRio, fiquei triste por deixar para fazer algo tão importante para mim, aos 70 anos, e logo com um jogador que não é bom jogador. Pode ter jeito com a bola, pode até ter talento e técnica, mas não é um jogador. E é um exemplo horrível para os mais jovens. Vou ter de explicar aos meus netos que me enganei muito, mesmo muito, no meu ídolo atual no futebol. Espero ainda ir a tempo. Deus que me livre dos meus netos ficarem assim, só porque eu lhes disse que o LucaRio era um exemplo.
Não vejo a hora de voltar e tentar consertar tudo isso com eles. Que mico hein?
Ana Santos, professora, jornalista
Sábado é dia de conto no Bug Latino. Contos diferentes, que deixam sempre alguma reflexão para quem lê. Contos que tentam ajudar, estimular, melhorar sua vida, seu comportamento, suas decisões, sua compreensão do mundo.
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Imagem: Nicolina Vaz de Assis, O Segredo




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