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"A Morte no Feminino", Bug Sociedade


"A MULHER E A MORTE"


Século XXI, pandemia de Corona vírus, mutação sei lá qual porque elas agora pipocam nos quatro cantos do mundo. O Brasil exporta mutações para vergonha nacional – se é que alguém do Governo liga para o significado de vergonha.


A mulher que envelhece e morre é muito diferente apenas da mulher que morre? O fim da energia, do sopro, o fim do caminho. Levantar os olhos e admitir que o que não se fez, vai ficar em aberto – talvez este seja o meu maior desafio, quando chegar a hora. Há tanto por fazer e há tanto o que não fiz, não fizemos, não fizeram.


Olhamos o fim do curso da água da vida e ali deixamos nossas armas, desafiando governos, ONGs, grupos, empresas, pessoas a tomarem o nosso lugar. Pedindo que tomem o nosso lugar e sigam, imploramos que o façam, também assumindo a vergonha do nosso egoísmo diante de um mundo à esmo.


Que espécie de sociedade se criou ao redor do universo feminino? Que espécie de progresso deixaremos? Quantas mulheres foram salvas de seus maridos machistas-possessivos-malucos-doidos-varridos? Quantos policiais homens-machistas-soldados levantaram os olhos e os pousaram sobre mim, nós, sobre elas, sobre vós? Quantos olharam a saia e pensaram na piada maligna do machismo – “Também, com essa roupa”?


Eu teria tanta vergonha se tivesse me omitido e tento não me omitir. Pago um preço por isso – sempre caro, cada vez mais caro – mas alcanço cada vez mais pessoas com meu filho mental, emocional, racional – o Bug Latino.


Quando a morte alcança uma mulher, muito mais do que o fato da morte, ela vê o seu ao redor, processa o mundo novo, tecnológico e – tantas vezes – procura habitá-lo de pessoas talvez um pouco mais generosas e abertas à diferença, seja ela qual for.


Um mundo ainda com Dalai Lama e o Papa Francisco, mas que precisou e já levou Mãe Stella de Oxóssi, com sua flecha certeira pra caçar a paz, no Universo.


Não estamos em paz. Nunca estivemos. Ainda nos buscamos, me busco, te buscas. Diante da morte, que mundo vejo, vês, vedes?


Talvez nessa hora, finalmente me rendo ao cansaço de buscar uma solução de beleza, de aglutinação, de conjunto que nessa escuridão, por mais que procure, não vejo, não vês, não vedes...

Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV



"As mortes da Mulher"


Mulheres. Morremos. Muitas vezes em vida e parece que uma “em morte”.


Demasiadas vezes e demasiadas mulheres. Morremos na morte de filhos, morte de maridos, morte de sonhos, na destruição social da qualidade de vida, desgostos pessoais e familiares, falta de amor, mentiras e segredos, exploração, relações egoístas e violentas, agressões, estupro, violação, tortura, feminicído.


Muitas sabem da sua morte com antecipação. O médico dá meses, dá alternativas, dá probabilidades. E, quanto mais pessoas elas amam, mais sorriem, no meio do momento, do percurso, do destino. Se lhes perguntarmos como aguentam, talvez digam que não têm outra forma, que não podem mostrar sofrimento quando todos ao seu redor sofrem tanto. Ser mulher.


Outras falam pelo silêncio. Falam muito. Dizem tudo. Elas sabem de tudo, sempre souberam, mas levam com elas tudo isso. Não vale a pena, nunca valeu a pena essa guerra, essa luta, esse medir forças, esse desmascarar. E fazem o seu caminho sós. Porque percebem que os outros não são capazes. E porque vieram sós, viveram sós e vão embora sós. Mulheres.


Quando os que amam sofrem, morrem um pouco todos os dias. Enquanto o fazem silenciosamente, se multiplicam em tarefas, em paciência, em disponibilidade, em energia, em boa disposição. Quem olha distraído, pensa ver um milagre. Ser mulher.


Mulheres idosas, já foram, em algum momento da sua vida inteira, rejeitadas, traídas, excluídas, humilhadas, exploradas, assediadas, agredidas. Nunca esquecem o olhar de prazer de quem o fez, a provocação direta, indireta, aquele momento. Sofrem para sempre mas precisam aprender. Procuram outros caminhos. Aqui, uma encruzilhada sensível, onde conseguem ou correm riscos... Se conseguem, tornam-se seguras, procuram caminhos independentes, pessoas que as respeitam e valorizam. E voam. E se tornam intransponíveis. Se não conseguem, vivem “debaixo de água” constantemente, procurando um lugar para respirar, para sair da água. Lugar perigoso, onde a violência do ciúme e da manipulação e do orgulho proporciona soluções tenebrosas se um dia descobrem a porta para sair. Sabemos disso diariamente na televisão...


Morremos quando o nosso amor não é correspondido, quando a amizade é vazia, quando a nossa dedicação não é entendida, quando apenas um belo par de pernas interessa. Morremos quando consideram que apenas somos carne. Morremos quando não conseguimos salvar o mundo. Morremos, quando não somos. Morremos em cada segundo que sabemos como viver e que apenas nos deixam assistir. Quando faremos parte da lista de convidados da vida? Enquanto aguardamos, morremos enquanto vivemos. Mulheres.

Ana Santos, professora, jornalista



"Quando chegam ao fim"


Quando nos relógios não há mais minutos para gastar,

quem és tu, mulher?

Parada frente ao abismo que é, enfim, o final,

despedes-te serena?

Vais feliz, mulher?

O que leva o teu íntimo aos braços da morte?

Quais foram as certezas que carregaste,

e as dúvidas que não disseste?

Tranquila, fizeste-te, dia-a-dia,

para que nunca faltasse complacência à tua volta.

Foste forte, mulher, mas a que custo?

Quanto de ti guardaste?

Esgotou-se-te o tempo.

Já não pousas o olhar nos horizontes. És passado.

Que passou pela vida carregando o mundo às costas.

Levaste filhos nos braços

e outros às cavalitas.

Sorriste, quando te humilharam.

E guardaste, no silêncio, os gritos.

Das lágrimas que choraste, ninguém soube.

Foram tuas. Só.

Na hora de lutar, arregaçaste as mangas.

Quando foi preciso um ninho, arredondaste o colo.

Mulher que foste mãe. Que foste estéril.

Mulher que carregaste crianças que não escolheste ter.

Mulher que abriste o coração e as pernas a tantas guerras, a tantas feridas.

Que largaste grilhetas, mandaste ao chão a mordaça e, num sussurro, exististe.

Quando chegam ao fim as horas e os dias,

que fica de ti, mulher?

Que restos permanecem? Que marca deixas?

Tu, mulher, que és de nós todas a primeira e o futuro.

O compromisso e a esperança.

As desventuras. As histórias.

O amor.

Cláudia Quaresma, convidada

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