Bem, sou carioca. E Salvador anda me dando muitas saudades de casa, ultimamente. Alcione não é do Rio? A gente nem lembra que a Mangueira pode estar em toda parte, até no Maranhão! A voz, o jeito malandro-descolado-afetuoso que ela mostra, tudo isso é a cara do Rio, tem a nossa personalidade. A gente, lá em cima, no último degrau da arquibancada, dava a mão pra todos os que subiam e desciam e lembrava que o degrau é muito alto – e é mesmo muito alto descer os degraus, quando a Concha está lotada! – mas estávamos todos juntos, aos milhares, ouvindo, curtindo, cantando e conversando, graças a Alcione.
Havia alguma coisa com o som – pelo menos pra quem estava lá no alto, ali ao lado do espaço para pessoas com problemas de locomoção. O som distorcia. Eu mesma não compreendi nada do que Alcione falou. Mas ali, no meio do povão, o que não se ouviu ela cantar, a gente sentiu e ouviu dos vizinhos cantores mais próximos porque música popular brasileira é assim – envolve todo mundo, é uma espécie de magia contagiante que deixa os contornos de todos mais próximos da qualidade que a gente não vê quase em lugar nenhum do Brasil. Mas que se vê ali – Alcione é grande, é tradição, trabalho, carisma, domínio de palco e de público. Organizou o congestionamento de pessoas perto do palco, pediu pra sentar e todo mundo que estava na parte de baixo obedecia a tudo o que ela pedia. Já pensou se ela pedisse pra não jogar papel no chão? E outra pergunta: como a gente, brasileiros que enfrentam e se enfrentam num dia a dia louco e cheio de tiros a mais que veem do lado da polícia e também do lado dos bandidos, nos comportamos assim tão calmamente quando a coisa é boa, mesmo de pé e apertados, apertadíssimos? Será que é porque coisa boa chama coisa boa? Será que é porque sabemos muito bem o que é qualidade e tanto quanto sabemos reconhecer trabalho, quando vemos resultados que se prolongam por décadas de sucessos?
Alcione foi tão generosa por passar por uns trinta anos de sucessos, foi tão carinhosa ao cantar a Bahia, lembrar Emílio, a velha guarda e fazer tudo isso com o vozeirão impecável de sempre. A gente só percebia que o tempo tinha passado pra ela quando a cadeira vinha e ela sentava pra descansar os pés porque a garganta estava perfeita como sempre.
E ela cantou muito e cantou bem. E fez a Concha inteira entrar em êxtase total, como nunca vi. Olhos fechados, braços estendidos, muitas pessoas pareciam estar olhando para passados, amores perdidos, mágoas que ficaram pra trás, se movendo como se estivessem num culto à lembrança do que Alcione já cantou e marcou na vida de cada um.
Quando ela acabou o show da primeira vez, ninguém nem se deu ao trabalho de sair do lugar. E ela voltou e cantou mais uma. Uminha... muito pouco. Minha vizinha de arquibancada falou que com certeza era troca de roupa porque Alcione ainda não tinha autorização do público pra sair, ir embora. É isso ou algo assim – gente boa, competente, não tem autorização pra ir embora. A gente fica logo carente, querendo um pouco mais. Algo que algumas excelentíssimas autoridades insistem em não aprender.
Aula de educação cívica, convívio pacífico, simpatia, cuidado, carinho, atenção... tudo em milhares...tanta coisa emocionante eu vi ontem... Foi sensacional, incrível, inacreditável! Quem não foi – que pena – perdeu!
Ana Ribeiro, diretora de TV, cinema e teatro
Chegue cedo. TCA pode ter 3 eventos em simultâneo. Como hoje. Mais difícil encontrar estacionamento. Vá de Uber ou de Táxi. Adorava poder dizer para ir a pé, mas depende da distância e das ruas que passa. Se for gringo/a não leve celular. Tem muita movimentação em volta do espaço. Causa uma boa sensação mas fique de olho atento porque se vacila fica sem celular. A orgânica depois das obras ficou bem melhor, tudo é muito mais seguro. Mas mesmo assim, fique atento.
Ingressos esgotados. Muitas famílias. Muito controle na entrada, muita gente. Ambiente tranquilo no meio de muita gente. Os baianos deviam dar cursos de como se comportar no meio de multidões. E rola pipoca e cerveja. E rola acarajé e cerveja. E rola cerveja. Durante todo o show pessoas sobem sem nada e eu penso que vão embora e lá veem de novo e descem com cerveja, comida. As vozes vão ficando mais desafinadas e dengosas ao longo do show. Você está na Bahia!
O mundo mudou. Já não se vive sem registrar o momento. Tudo o que tem valor social, é filmado, fotografado, comentado e postado nas redes sociais. A experiência de assistir a um show na última fila tem um efeito surpreendente. Você vê mais de mil celulares no ar, filmando, tirando fotos. Muito louco. Não tem volta. Você pode até não fazer mas precisa aceitar. E viver com isso. As pessoas viram de costas para tirar fotos de si no show. E estão felizes. Você sente o celular da pessoa que está atrás de você na cabeça quando filma e nas costas quando comenta a filmagem ou a foto. E o mundo está assim, não é só a Bahia.
Uma DIVA. Uma noite especial. Uma profissional do palco, do espetáculo. Uma voz extraordinária. Uma forma clássica e elegante de entrar no palco, de beber água, de se sentar, de se despedir. Pertence a um mundo de poucos.
Nascida no Maranhão, comentou que se sente soteropolitana (de Salvador). Amada em todo o mundo, com centenas de prêmios, mais de 40 álbuns, 45 anos de carreira. 70 anos de idade. Respeito.
O nome do show é “Eu sou a Marrom” porque Alcione é conhecida como Marrom. Não sabia. Gringa!
Aprendeu com o pai a tocar instrumentos. Trompete e clarinete foram os instrumentos que a tornaram ainda mais famosa. Em Portugal só conhecíamos sua originalidade com o trompete. E sua personalidade e talento. Impressionante e intimidante de tão “extra ordinária”.
Cantou sucessos, proporcionou momentos intensos como quando cantou músicas de um amigo querido – Emílio Santiago. Um cantor incrível que Portugal não conheceu mas que o cantor Beto Narchi canta maravilhosamente. Imaginem Alcione e Beto Narchi cantarem “Saigon”, em dueto. Ia ser incrível. Se está ou vem à Bahia não pode perder um show dele. Obrigatório.
É muito impressionante perceber que as letras das suas canções falam de momentos da vida de todos e todos cantam como se pudessem finalmente ter a coragem de dizer o que nunca disseram. “Não posso mais alimentar esse amor tão louco, que sufoco...”; “...Eu acho que paguei o preço por te amar demais, Enquanto pra você foi tanto fez ou tanto faz...”; “...Não me pegue não, não, não, Me deixe à vontade, Deixe eu curtir o Ilê, O charme da Liberdade...”, e tantos outros.
Alcione também me lembrou as DIVINAS DIVAS, sua classe. Quem não assistiu ao filme que as recorda, não perca por favor. Precisamos de manter a sua memória.
O BUG Latino, agradece a cortesia dos 2 ingressos à Carambola Produções e ao Laboratório da Notícia, respetivamente a Milena, Fernanda Matos e Magy. Muito gratas!!!
E, quando for para casa, passe na Mouraria e experimente uma pizza da “Teresa Filósofa”. Você vai enlouquecer!
Ana Santos, Jornalista
Deu vontade de assistir ao show da marrom