Um filme dedicado a devolver a nossa capacidade de sentir e por isso recheado de silêncios e inúmeros momentos suaves. Tom Hanks... é Tom Hanks no máximo do domínio da cena, sendo quase provocantemente preocupado em ser bom – não por defeito ou estar “over”, mas porque estamos nos tornando uma raça que sente profundo mal-estar diante de sentimentos suaves, mas profundos. A plateia no cinema estava mesmo descontrolada, derrubando coisas, falando, rindo, indo embora, numa fuga absoluta de suas emoções.
Chorei muito por ficar diante do que sinto, das perdas que sofri, do que adoraria conquistar, da dor que a insensibilidade causa em mim. E também chorei por amor, por carinho, por me perceber como um ser capaz de amar, de sentir, de me aproximar – esta é uma das melhores habilidades de Tom Hanks, ao criar meios de nos fazer sentir tão imensamente, apenas mostrando delicadeza em cada gesto da sua personagem.
Talvez eu também tenha sucumbido ao sentimento do filme porque ele fala tantas vezes o motivo pelo qual o Bug Latino nasceu – as pessoas precisam falar do que pensam e sentem, ao invés de fugirem, ao esconder suas emoções. Colocar em palavras a morte, a frustração, a raiva, a tristeza. Sem pílulas. Colocar em palavras o amor, procurar as pessoas que nós amamos, apenas pra que elas saibam, tenham a certeza de serem amadas.
O filme é só isso. Só? Há um momento em que o pai pede que o filho o olhe nos olhos, ao invés de reagir, reagir, reagir. Olhar fixamente. Dentro dos olhos de uma pessoa que você sabe que sabe muitos dos seus segredos, seus jeitos. Dá um medinho – o de se revelar. E no cinema, quem teve o mesmo medinho e fugiu da intensidade de Tom Hanks? Quem tem coragem suficiente para enfrentar seu coração durante duas horas?
Sem álcool ou drogas, levantar os olhos para dentro de nós e criar a viagem onde, nos olhando por dentro, tenhamos coragem de abandonar comportamentos, rancores e ressentimentos inúteis para ver a realidade do que podemos ser, se nos dermos uma chance de crescer, uma chance de enfrentar nossas dores infantis sem medo de não conseguir.
Um poema delicado, sutil, com riqueza de detalhes de personalidade e emocionais. Nem ousem dizer que o filme “é água com açúcar” pra justificarem não ir – passa bem longe. Mas é imperdível.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
Um filme incómodo, sobre pessoas que tentam ser bondosas. As pessoas na sala de cinema atendiam celulares, riam, falavam alto e algumas foram embora a meio do filme. É assustador ver a nossa dificuldade em aceitar a bondade como algo verdadeiramente importante. Em vez disso, consideramos a bondade e enfrentar os sentimentos menos nobre, como algo bobo, só de gente boba e patética. E fugimos. Consideramos até ridículo.
Personagens ou personalidades públicas que falam calmamente, com tolerância, de sentimentos simples e estruturais, para as crianças, para os seres humanos com vidas mais difíceis por problemas de saúde, financeiros ou emocionais. É tão mais fácil rir delas. Parecem “padres”, moralistas baratos que tentam nos vender sua receita ou sua crença. No entanto, se prestarmos atenção, podem afinal ser pessoas que perceberam a nossa dor e querem ajudar. Sabem bem o quanto é difícil ser sempre uma boa pessoa e tentam motivar os outros para não desistirem dessa busca. E muitos fazem-no publicamente, em direto/live, nas televisões, nos mídia de forma geral. E durante anos, 30, 40, 50. É uma capacidade impressionante. Como refere Mr. Rogers, é necessário muitas horas de natação, muitas teclas de piano “graves”, muita reflexão interior.
Lembrei de algumas pessoas em Portugal que fizeram algo próximo, como Júlio Isidro, no Brasil, talvez Maria Braga. De outra forma, Oprah, nos Estados Unidos.
Falar abertamente sobre a infância e dar uma importância eterna a esse momento da nossa vida. Lembrar os brinquedos, as bonecas, os fantoches que faziam parte da nossa vida e do nosso imaginário.
Falar abertamente sobre sentimentos, para poder saber lidar com eles. Amadurecer. Saber o que fazer quando se sente raiva, quando se está triste. Como lidar com tudo o que incomoda no que sentimos, de forma que não prejudiquemos a nossa vida, a dos que amamos e a nós próprios.
A importância da família, das relações humanas. A importância de falar sobre temas difíceis, para todos e principalmente para crianças, como a morte, as doenças, a raiva, etc. Um confronto entre o que julgamos e avaliamos nos outros e o que somos capazes de fazer. Criticamos muito, mas muitas vezes nem conseguimos fazer metade do que os outros fazem.
Este filme, este senhor, me fez lembrar do que o Bug Latino está tentando fazer. Daria tanto jeito ter um senhor destes por aqui. Sempre procuramos essas pessoas, principalmente as que não são midiáticas. Devagar temos encontrado uma atrás da outra e o nosso “time” discreto e inteiro vai seguindo. Obrigada a todos e a todas as nossas Mr. Rogers do Bug. Somos muito gratas sempre.
Tom Hanks, novamente num desempenho espetacular. Um ator incrível. Junto com Meryl Streep, são referencias de representação eternas. Como Nadal, Federer, Djokovic, no tênis.
Tem um momento em que Tom Hanks olha a câmera durante quase uns 30 segundos. Olha para todos no mundo em silêncio. Com uma expressão incrível. Que momento!!!
Um filme a não perder. Não esperava que fosse tão intenso, tão convidativo a uma reflexão interior sobre a vida. E não esperava que uma personalidade da TV americana fosse tão humana. Uma grande e boa surpresa.
Ana Santos, professora, jornalista
Informações sobre o filme
https://www.imdb.com/title/tt3224458/
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