Nos acostumamos a nos ver como os grandes vilões-herdeiros de um passado de exploração ou a apontar o dedo para o passado e a história para censurar nossas atitudes. Aqui no Brasil, pelo menos, falamos dos nossos erros e tentamos encontrar, apontar e prender os opressores com a ajuda do Estado. No Sul, situações análogas à escravização de operários nos vinhedos acontecem, da mesma forma que em todas as outras regiões do País. O dono da vinícola terceiriza a mão de obra para a colheita, que a terceiriza para outra empresa e assim pessoas são exploradas, mas não se divisam os culpados, pulverizados na prestação de serviços “sem-vergonha”. Culpa, culpa, nossa máxima culpa – mas escândalo! O documentário O LADO NEGRO DA INDÚSTRIA DO CHAMPANHE, de pouco menos de 30 minutos, aponta tentativas de acobertamento das mesmas situações, com as mesmas estratégias de exploração, mesmas dificuldades financeiras que empurram migrantes – muitos em situação irregular – aos mesmos riscos nascidos do desespero financeiro.
O filme causa náusea, mas é necessário por muitos motivos: precisamos deixar de nos ver como os piores entre os piores, mas precisamos ver o mesmo erro sendo cometido por nações com imagem firmada pelo “slogan Liberdade, Igualdade, Fraternidade” – mas talvez para eles, muito mais do que para todos.
Em poucos minutos, nós conseguimos passar o olhar por muitos discursos libertários – muitos de araque – e fortalecermos nossas iniciativas, denúncias, preocupações e sobretudo iniciativas, ações.
Em O LADO NEGRO DA INDÚSTRIA DO CHAMPANHE percebemos que embora estejamos longe, apontamos nossas mazelas, falamos delas, enquanto nossos compatriotas franceses ainda estão tentando entender como passaram de grandes apoiadores do trabalho de estrangeiros para exploradores de mão-de-obra aprisionada, escravizada e paupérrima.
A vergonha precisa continuar a nos doer muito, a latejar a nossa alma – mas agora, sabemos – a alma dos franceses também.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
Infelizmente esta situação ocorre cada vez mais e por todo o mundo. As pessoas que têm necessidade de ganhar dinheiro urgente e imediato, têm cada vez mais à sua disposição, condições horrorosas de trabalho. É inacreditável onde estamos a chegar por causa dos lucros, da ganância, da ambição. Sabemos que não vale tudo, mas agimos desumanamente.
Existem associações que ajudam, sindicatos, pessoas corajosas que enfrentam estes sistemas. Duas coisas ficam muito claras para mim. Uma é que esconder o que se sofre, por medo, não ajuda, não resolve, tudo vai piorar. Dessa forma nunca se resolve. Então a saída sempre será encontrar formas de falar, de divulgar, procurar ajuda, procurar aliados, ter a coragem de tornar público. Só quando se escreve, se filma, se conta, se diz ao mundo o que está a suceder – mesmo com o mundo sabendo, mas em silêncio – é que se obriga esse “mundo” a enfrentar, reconhecer a realidade e começar a se mover para colaborar com a solução.
O mundo parece dividido entre os que podem e têm e os que não podem e não têm. E os que têm exploram os que não têm, em vez de os tratar bem, afinal dependem deles para TER. Horrível.
A segunda coisa é que sem comunicação nada acontece. Então, se você vai trabalhar para um país, nem que seja por poucos meses, precisa saber, no mínimo, o básico da língua desse país. Senão, será mais explorado ainda.
Assista.
Ana Santos, professora, jornalista
Sinopse: Champanhe: símbolo de glamour e celebração. Dezenas de milhares de trabalhadores migrantes vão para França todos os anos para colher uvas na região de Champagne. Mas alguns pagam um preço elevado para trazer este produto de luxo ao mercado.
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