Pedofilia, pedofilia, pedofilia. No Brasil nós temos que começar a repetir esse nome e procurar onde estão, onde se escondem esses ratos. No filme, depois de quase 20 anos, o rato vai para a cadeia. Mas na vida real, há muitos ratos à solta.
Cuidados com os mitos, os superamigos, os inimagináveis. Mitos são narrativas utilizadas pelos gregos antigos para explicar fatos da realidade e fenômenos da natureza, as origens do mundo e do homem, que não eram compreendidos por eles. Então respondam: Existe algum mito? Ou mito é uma forma de ocultar a explicação assertiva dos acontecimentos de nós, mas principalmente das crianças, que precisam de espaço para falarem de pessoas que tocam, assediam, lambem, beijam, estupram?
A delicadeza do filme em mostrar os meandros do assédio é arrepiante. O desejo disfarçado de carinho, o não corajoso da criança deturpado em malcriação, mágoa, o silêncio da família, o silêncio da família, o silêncio da família... É quase como uma reza, uma ladainha. O silêncio da família... Que não vê e que não dá espaço para ver porque para ver precisa aprender a ouvir.
Quem ouve seu filho? Quem não ouve? E ouvir não é dizer “você não arrumou, não estudou, não fez, bagunçou. Ouvir é um trabalho silencioso de se fazer presente e esperar o tempo das crianças. Quanto tempo temos pra elas?
Um filme que mostra a destruição emocional, a fuga, o pesadelo permanente, a tortura da memória. E o mito – ali caído. Mas culpando a criança “porque ela não gritou, aceitou... deveria estar gostando”... Um filme para professores e pais que dói sem parar, do primeiro ao último minuto. Mas uma dor necessária, que devemos nos auto infringir para proteger nossos pequenos. E que o mito caia e seja cuspido por todos. Pedófilo. Pedofilia. Vamos articular essa palavra no Brasil. Há ratos de sobra no porão.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
Um filme sobre pedofilia na família e amigos. Deveria ser obrigatório passar nas escolas, nas televisões públicas, gerar debates, abrir a comunicação e a informação a todos. Em todo o mundo. Enquanto não fazemos nada, eles destroem sonhos, pessoas.
Os pedófilos são urubus, abutres que aguardam os momentos durante anos, se preparam e se estabelecem em relações de extrema confiança com os adultos que protegem as crianças, para poderem depois ter espaço para as suas ações. As crianças e jovens percebem que não podem falar por que ninguém vai acreditar que aquela pessoa perfeita fez algo tão errado, tão ignóbil. E as crianças e jovens vão ficando com comportamentos estranhos o que ainda contribui para não terem crédito na família se contarem o que sofrem. Não se engane. São muito difíceis de apanhar. E quando começam a deixar pistas, as pessoas olham para o lado. Não poder fazer nada por não saber é algo que pode ser corrigido ao ver estes filmes, ao passar a estar mais atento e vigilante. Mas saber e olhar para o lado? Como se consegue viver em paz? Por favor não façamos isso mais. Não tenham medo de “criar um problema”, como todos vão dizer. Nem de estarem sempre a insistir na mesma “coisa”. Na verdade, vocês estarão a enfrentar e resolver e impedir um problema. A salvar pessoas. A evitar que sonhos e vidas sejam destruídas.
Um filme extremamente sensorial, lindo pela forma como mistura passado, presente, como mostra a importância de pessoas especializadas para ajudar a enfrentar, lidar e sobreviver a traumas. Como escolhe personagens assertivamente e nos mostra claramente como tudo sucede. Em que espaços, confianças e distrações nossas, eles circulam. Desabei em choro nos abraços, no testemunho da irmã, e na forma como falou em tribunal a menina mulher.
O que as crianças querem, deve ser tido em conta. Deve valer por que elas vêm e sabem coisas que nós não vemos, não sabemos. E elas têm opinião e essa opinião deve ser respeitada. Seja em que idade for.
E essas crianças e jovens, os que sobrevivem, se tornam adultos. Adultos por vezes com comportamentos desadequados/inadequados, instáveis, evitando reuniões familiares, tornando-se indesejáveis. Prestemos bastante atenção às crianças. Elas dizem tudo sem falar. E os adultos também.
Aos pedófilos declaro que o que fazem é errado apesar de não o acharem. O que têm desejo de fazer destrói a vida e os sonhos de seres humanos indefesos e por isso peço que aceitem se tratar. Não é uma opinião se a pessoa acha bem ou mal. É um fato. É um crime.
Agradeço muito por ter podido assistir a este filme. “Afinal” é universal o silêncio, o faz de conta, os que nunca vêm nem sabem de nada...e tudo sabem, os que dão a mão e entendem e acreditam em você, os que amam não com palavras mas com ações. Um filme que merecia um óscar.
Ana Santos, professora, jornalista
Informações sobre o filme
https://www.imdb.com/title/tt7502234/
Circuito Saladearte