Num dia tão especial quanto o 30 de outubro, o Bug resolveu ver – e indicar fortemente – o filme com Johnny Depp ESPERANDO BÁRBAROS, para construir na mente das pessoas como se “criam inimigos da Pátria”, sejam eles quais forem, estejam onde estiverem e façam o que fizerem.
O nível de opressão do filme é fortíssimo. A tensão, torna o ambiente mental da gente irrespirável. Não acontece nada muito violento visivelmente, mas a nossa imaginação sofre momentos de violência intermináveis. Trilha sonora e ambientação cênica criam a impressão de que algo vai acontecer e será “pior que o esperado”. A ambiência de medo é totalmente reconstruída, assim como o medo que uma pessoa sente ao imaginar que seu vizinho, ali ao lado, pode ter um arsenal com fuzis, metralhadoras e granadas, entendem?
Mesmo assim, corpos mutilados, torturados, o desfile de presos políticos, sua exposição diante do povo, a anestesia emocional imposta pelos horrores estão ali. Podemos imaginar a ultra direita e a sua busca ininterrupta de novos inimigos da Pátria, com bandeirolas esvoaçando, o desfiles de soldados – pra todos verem como os filmes sobre ditaduras são sempre repetidos e quem cai nessa conversa mole é tolo ou tolo e ignorante – não existem vencedores numa ditadura – seja qual for sua ideologia - já que todos são úteis ou descartáveis. Num dia como o de hoje, de extrema expectativa, ver o que pode ser de nós e o que podemos fazer para evitar que o pior nos atravesse era vital.
Elenco impecável. Johnny Depp, insuportavelmente nojento, asqueroso mesmo, violentíssimo, sem erguer a voz por um segundo. Mark Rylance, numa interpretação minimalista, perfeita e delicada – fazendo a contraposição que Depp pedia, com maestria. E Gana Bayarsaikhan... que atriz...
Já que hoje está sendo o dia - não de escolhermos um candidato, mas quem somos - vale a dica e a inspiração. Esperemos que não se fabrique uma guerra fratricida só para nos distrair da “boiada passando”...
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e Tv
Um filme difícil mas necessário. Baseado numa das obras literárias de J.M. Coetzee, é uma indicação de um bom filme, mas de um filme que mexe com as entranhas emocionais do público.
A autoridade por vezes, com a necessidade de mostrar trabalho, competência, valor, poder, procura problemas, conflitos, defeitos, onde, muitas vezes, se conseguiu um equilíbrio tênue, através de muito cuidado e sensibilidade. E destrói “castelos de cartas” importantíssimos, que por vezes demoram imensos anos a reconstruir, outras vezes, nunca mais se consegue a construção nem o equilíbrio. Eu falei autoridade, mas pode ser a cegueira ambiciosa humana, pode ser o desejo de sucesso e poder a todo o custo. Em um lugar onde a convivência entre duas culturas totalmente diferentes acontecia com cuidados de ambos os lados, alguém acha que resolve, “o que não existia”, torturando, menosprezando, matando, etc. Onde já vimos algo parecido? Você inventa problemas e você cria o caos, você coloca as pessoas umas contra as outras – por vezes do mesmo país. Alguém que ocupa o cargo de presidente de um país não pode nunca dividir o povo. Nunca, em hipótese alguma. Se ultrapassa essa linha, vai ultrapassar muitas mais: os boatos, as mentiras, as manipulações, etc, etc, etc.
Um filme de arrepiar os cabelos e a alma e de nos colocar a questão: como é possível alguns seres “humanos?” fazerem o que fazem?
Uma paisagem de tirar o ar, uma trilha que combina totalmente com as paisagens. Robert Pattinson, ficou demasiado ligado à sua primeira “aparição” cinematográfica, que demorei um pouco a habituar-me ao seu papel neste filme. Johnny Depp, faz um personagem infestado de maldade e tive dificuldade em me desviar das recordações dos comentários bizarros do seu divórcio, no tribunal. Fez bem de mau, de alguém carregado de horror neste filme, mas parece faltar algo a ele e a Robert Pattinson. Amei Mark Rylance, num personagem profundo e justo. Fiquei com vontade de ler o livro porque o perfil de cada personagem é muito intrigante.
No dia que vamos divulgar este filme, com esta crítica, o Brasil saberá se vai em direção da democracia ou em direção de quem busca dividir para reinar, dividir para enfraquecer.
Ana Santos, professora, jornalista
Sinopse: Um magistrado de serviço em uma terra distante questiona sua lealdade ao império.
Diretor: Ciro Guerra
Elenco: Mark Rylance, Johnny Depp, Robert Pattinson.
Trailer e informações: