Almodóvar. Almodóvar! De novo e surpreendente como sempre. A primeira surpresa de cada filme dele é que você nunca sabe em que ritmo vai começar. Dor e glória começa num ritmo mais lento – talvez muito mais lento – do que os outros filmes de Almodóvar. Talvez pra que a gente se acostume à beleza do tempo porque Penélope Cruz e António Banderas estão envelhecendo lindamente - e o mesmo serve pra mais da metade do elenco – pessoas maduras, com rugas, traços e vidas expostos nos rostos – numa outra provocação gritante à “beleza emborrachada eterna” de americanos e brasileiros que, assim como Trump, ficam com aquela boca de “boneca sexual inflável”.
Outra louca história, onde o mais louco é você desconfiar que é mesmo uma autobiografia, num filme lotado de momentos especiais, olhares especiais, emoções especiais. Um filme no qual podemos rever aquele olhar inteligente e quase infantil de Almodóvar - revelado nas entrevistas coletivas, em muitos outros olhos: desde os do menino – que menino incrível o cinema revelou – até os de Banderas: brilhantes diante do amor, do desejo, do beijo na porta de casa – uma coisa maravilhosa eu me lembrar de quando dei meu último beijo à porta de casa... porque há o encantamento de se despedir e o encantamento de não precisar mais se despedir...
Perceberam? É um filme que revolve lembranças com suavidade, o que nem é muito o estilo de Almodóvar – mas que ele soube fazer muito bem.
Inúmeras cores psicodélicas, animações ma-ra-vi-lho-sas, figurino e cenário incríveis. Deve concorrer ao Oscar do ano que vem, sem dúvida. Nem vou citar as interpretações. Todos conhecem a qualidade dos atores que fazem parte da órbita do planeta Almodóvar.
Conheço inúmeras pessoas que colecionam seus filmes, que são seguidores vorazes. Pra vocês eu afirmo: vale totalmente à pena ver este também. Sendo totalmente diferente, é a cara dele, vocês verão.
Vale o indicativo supremo: quem não for vai perder!
ANA RIBEIRO
Diretora de teatro, cinema e TV
Saber que existe um filme novo de Almodóvar é sempre uma alegria. Era em Portugal e vejo que aqui é igual. Você sabe que vai entrar numa viagem diferente e reflexiva. O nosso olhar no mundo muda depois de cada um dos seus filmes.
No início, fiquei fascinada com as cores e seus belos movimentos que nem prestei muita atenção às letras e créditos.
Os seus filmes têm um ritmo muito próprio e que nos obrigam a travar o nosso. Por isso, no início sentimos sempre uma resistência interior até nos adaptarmos.
Existem cores e associações de cores que em Portugal chamamos de “as cores Almodóvar”. Continuam presentes, lindas. As linhas do mobiliário, a decoração forte, também. Adorável. As linhas do figurino são lindas também. Sempre amei as roupas dessa época.
A trilha sonora/banda sonora é linda, profunda, como toda a música espanhola. E música e cantor/a escolhido/a por Almodóvar é qualidade certa. Revisita suavemente Chavella Vargas de novo, e que bem que sabe ouvi-la.
A coragem de expor a sua vida, o que existe escondido na vida de muitas pessoas com medicamentos/drogas, os encontros e desencontros da vida deixa lastro em quem assiste. Mais um diretor que traz sua mãe para o filme e apazigua sua saudade e dor.
Os planos tão próximos e intimistas que até vemos um ponto negro/cravo na fonte de Banderas, num deles. O ator precisa ser excepcional para estar nos seus filmes. Talentoso e lindo. O corpo do pedreiro/trolha é de uma beleza pura onde podemos perceber uma vida ativa. Não um corpo “comprado”. Pedro Almodóvar é um especialista em encontrar atores lindos e talentosos. Desde sempre. Filmados de forma despretensiosa, aos poucos vamos admirando os sorrisos, os gestos, as individualidades charmosas de cada um.
O ator mais jovem, é uma fofura. Lindo, talentoso e muito encantador.
António Banderas bem melhor do que quando ocupou o lugar de Picasso, na série. Lembrando os velhos tempos de suas participações nos filmes de Almodóvar.
Penélope Cruz está cada vez melhor. Se adapta a qualquer papel. E sendo uma das melhores atrizes da atualidade, julgo que ainda vai espantar muitas plateias com o que ainda tem de talento dentro de si.
O Bug Latino agradece a cortesia da Saladearte. Muito gratas
Ana Santos, professora, jornalista
Informações sobre o filme:
https://www.imdb.com/title/tt8291806/
Site Saladearte