O doc, com 3 episódios, não perde muito tempo narrando a trajetória dele; o tempo é gasto descrevendo como pensa e o que chama a atenção de Bill Gates, sua forma de buscar como contribuir com o mundo e se relacionar com as pessoas. É um filme muito rico dentro da simplicidade com a qual é feito porque o que está em close o tempo todo é mesmo a mente de Bill Gates.
Muitas vezes a gente fica – o Brasil está super assim atualmente – discutindo quem está certo, onde mora a razão, quem dizem que desvia, quem dizem que não desvia, quem desvia escondidinho. Ficamos horas, dias, meses ao redor dessas inutilidades, com direito a todo tipo de grosseria e indelicadeza. Na América, já nem se divide apartamento se você pensa ou tem partido diferente, não namora se discorda partidariamente. E o mundo vai se acabando em fogo, lixo, plástico, grilagem no campo/ocupar a terra, fome. Em gente morrendo por falta de cuidado e bicho morrendo por nossa causa porque somos predadores assumidos.
Bem, ele nem olha pra isso. Apenas segue em frente e tenta contribuir. Investiu centenas de milhões em busca de um tipo de esgoto sem encanamento e cujos subprodutos (xixi e cocô) pudessem virar água potável e esterco. E conseguiu! Está implantando as privadas limpas na África e tentando vencer a guerra conta a diarreia. Assunto dos políticos? Políticas externas responsáveis? Ele nem olha pra discussão e foca em ajudar.
Bill Gates lê compulsivamente e tem um nível de cultura geral praticamente impossível de se alcançar. A Microsoft já chegou a valer 100 bilhões de dólares e o cara quando sai da empresa, monta um Instituto onde divide a sociedade com a mulher e simplesmente começa a fazer o que deve ser feito pelo mundo, de mente aberta.
Gastou muitos outros milhões exterminando a paralisia infantil. Política de saúde? O Brasil está perdendo até sua área de cobertura e entrega de vacinas? A África é muito pior? Tem gente doida no mundo que não acha que deve dar vacinas aos filhos? As doenças estão voltando? Ele nem se abala. Entra em negociação com o governo, cria softwares de cobertura territorial pra distribuir as vacinas com regularidade, cobre as áreas, se adapta à situação e parte do que tem para solucionar.
Chega? Não. Quando começou a trabalhar com a ideia de aproveitar o cocô do mundo, Bill Gates percebeu o nosso nível de desperdício de energia e também juntou pessoas, cientistas, pensadores pra definir como usar uma energia que não jogasse carbono na atmosfera. Ele sempre faz isso. Estimula pessoas a pensarem com ele, não se importa nada em ter seu nome relacionado a descoberta ou a vitória. Ele quer resolver e se alia a pessoas em qualquer lugar onde estejam, sejam de qual país forem. Ele não carrega o peso da burocracia nas costas e pode andar ligeiro em busca delas. Claro que Trump com suas guerras fiscais atrapalhou a negociação que ele ia fechar com a China para usar energia atômica através dos dejetos atômicos que estão esparramados grotescamente pelo mundo, mas ele simplesmente desvia dos problemas porque nunca se desestimula. Ele aprende com os problemas. Ele aprende.
Pois é. Me perguntem se Bill Gates, comendo hambúrguer e tomando refrigerante, é uma espécie de sábio/filósofo dos novos tempos. Me perguntem se é um gênio. Se viver em busca de práticas é alguma coisa, ele está fazendo a sua parte na vida. Uma aula que deveria ser vista pelas escolas, discutida nas escolas. Uma aula.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
Um sorriso aberto e uma curiosidade sem fim. Uma família que conseguiu socializar um jovem talento que se isolava. Um homem controverso para alguns em determinada época da sua vida e da vida tecnológica do mundo. “Acorda” publicamente para os problemas do mundo e tenta dar soluções com o talento e as condições que tem.
Porque não existem mais como ele? Porque insistimos em acusar pessoas como Greta Thunberg, Bill Gates e outros que em algum momento da sua vida decidiram intervir, procurar soluções para os problemas do mundo e se dedicar a isso? Porque temos sempre de procurar razões estranhas e obscuras e interesses manipuladores em pessoas que conseguiram sair da zona viciante e destruidora do mundo? Devíamos estar dando os parabéns, devíamos agradecer, devíamos nos oferecer para colaborar. Fazer o mesmo com o nosso dinheiro e o nosso tempo em vez de automaticamente criar problemas e acusar. Estamos automatizando comportamentos muito pouco sensatos no mundo. Alguém é uma pessoa boa ou se torna melhor...ficamos logo desconfiados. O que essa pessoa está fazendo? Que diferente maldade estará por detrás desses comportamentos? Não poderia ser mais fácil e mais bondoso, pensar que essa pessoa teve uma epifania, ou a vida a confrontou com a realidade, ou a morte de repente lhe parece mais próxima, ou percebeu como apenas é bom ser bondoso? As escolas no Norte da Europa estão trocando trabalhos escolares de casa para as crianças por boas ações. A bondade precisa voltar ao seu lugar, ao seu trono. E retirar a desconfiança, a maldade, a inveja, a competitividade e outras mais do lugar de poder em que se encontram.
O dinheiro é necessário a todos, mas a partir de uma determinada quantia, já sabemos que é prejudicial. Ou você decide fazer com esse dinheiro coisas boas para os que não têm e não conseguem. Porque de outra forma você entra no mundo de consumo de coisas, viagens, estatutos. Quem realmente vê a pobreza, a dificuldade de sobrevivência de crianças, adultos, idosos, pelo mundo, nunca será capaz de gastar dinheiro com coisas fúteis, desnecessárias. Ou então ainda não entendeu o que veio fazer ao mundo e precisa urgentemente de o fazer.
Bill Gates faz o que sempre me fascinou. Usa as suas capacidades e condições para resolver problemas de pessoas que estão em situações difíceis e sem saída. Nunca pensa como todos. Porque sabe que só pensando diferente, encontra a solução que ninguém encontrou. E sabe que pensar diferente é estimulante, delicioso. Porque não se intimida com as pressões do que se deve fazer, do que é adequado pensar e gastar o dinheiro ou de como gastar o tempo. Tem dinheiro suficiente para viver (trabalha e sempre trabalhou muito para isso), dedica seu tempo lendo sobre assuntos que o preocupam e se associa aos melhores do mundo em cada área para resolver problemas importantes, urgentes e determinantes para a vida de muitas, milhões de pessoas.
Transformar urina em energia elétrica, criar bateria de celular movida à urina, transformar as fezes em água potável, energia e terra para cultivar legumes (sem gastar água nem energia extras), criar uma usina nuclear que não seja perigosa, resolver as graves condições de saneamento dos países subdesenvolvidos, vacinação e controle de doenças como diarreia que mata um número astronômico de crianças antes dos 5 anos, melhorar o sistema de educação dos Estados Unidos, etc, etc, etc. Não deveriam ser os governos a fazer isto? Às vezes parece que vivemos num pesadelo em que os Presidentes e Ministros dos países afinal só estragam, complicam e destroem a vidas das pessoas. Mas esse pesadelo não parece ter fim...
É preocupante o número de pessoas que não se interessam pelos problemas do mundo. Que apenas querem gozar a vida. Na verdade parecem desperdiçar a vida. Que têm um olhar da vida pessoal e imediato apenas. Que não conseguem entender a maravilha que é ajudar os outros, com nosso dinheiro (se o tivermos), com as nossas ações, com os nossos pensamentos, com a nossa capacidade de resolver problemas.
Pensar em como resolver problemas deve ser uma atividade obrigatória para crianças e jovens. Uma habilidade que melhora com o tempo e a prática e com a confiança em si e nas suas capacidades. Se consigo resolver um problema que ninguém resolveu, fico viciada e quero encontrar a solução para outro e outro e outro. E falhar não é desanimador porque a caminhada para resolver um problema é cheia de tentativas e erros, de expetativas, de sonhos de imaginação rodando e rodando, até de repente a solução aparecer quase espontaneamente. E ocupa a mente, nos torna úteis e fazendo parte de algo grandioso. Diminui enormemente o perigo de depressão de crianças e jovens. De todos. Experimente. Escolha um problema, existem tantos. Escolha um que seja estimulante para você e se debruce, leia sobre, pergunte, pense, imagine. Depois tente resolver e avalie se deu algum resultado. Avalie o que deu errado e procure uma solução. Sempre pensando fora do comum, fora do padrão, fora do que é habitual. Você pode ajudar tanto o mundo. O seu mundo. O nosso. Você será mais feliz. Pode acreditar. Basta começar. Se não sabe como começar, procure exemplos como Bill Gates e leia um pouco sobre como foi com ele. Ou procure exemplos de pessoas menos ricas, menos famosas. Existem pessoas que resolvem problemas e que podem servir de estímulo e incentivo para você se sentir estimulado, que vivem na sua rua, que são da sua família. Observe, aprenda e faça do seu jeito. Você será muito mais feliz. Você nem faz ideia.
Ana Santos, professora, jornalista
Link Documentário “O Código Bill Gates” (2019)