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“Por quê?” Bug Sociedade

Estamos vivendo agora o mais absoluto nonsense virtual. Pra começar, a própria história de “vida virtual” é bizarra – a pessoa acha que vai conseguir manter a fachada de sua vida virtual até o ponto em que ela se transforme em sua vida real? Jura? Se você repete 10 trilhões de vezes que pra funcionar na sua vida, a vacina precisa imunizar de 90% pra cima, 95%, 105% ou 10055% isso muda que, a partir de 50%, a gente consegue parar uma praga e que o seu filho, o seu pai pode pagar a conta da sua impiedosa estupidez? Estamos vivendo isso agora. Os comerciantes fizeram um movimento e o prefeito suspendeu as medidas de restrição. O “filho do chefe” (não consigo avalia-lo nem como pessoa, nem como profissional porque mediocridade é um fato a se lamentar na vida) foi lá pressionar! Uau! Gente, o filho do chefe! Que tudo! E aquele machista, se junta com vários outros homens machistas, batem no peito, cospem na rua, coçam bastante o saco e – claro – nem pensam em usar máscara porque se sentem – na sua estupidez – à prova de tudo. “A Covid que fuja”!
Desse nonsense alimentado virtualmente, nasce o fato indiscutível que as pessoas acabaram morrendo sufocadas no meio da rua, na porta dos hospitais. Que no Natal havia famílias que praticamente acabaram, duas semanas depois da “festinha”. Nasce o fato indiscutível que o Brasil precisa parar de “pegar no tranco”, com medo de ver bebês morrerem sufocados nas UTIs por falta de oxigênio. Nós podemos e nós devemos parar a roda antes do atropelamento. E o “chefe” está assistindo o atropelamento de 210 mil. E contando. Tic, tac.
O nonsense machista aponta: quem tem coragem, não usa máscara. Elas são incômodas, abafam, sufocam. Sufocar é morrer sem acesso à oxigênio. O2. Uma coisa básica. Tão básica que qualquer pessoa, independentemente de sua ideologia, credo, raça, estado de espírito, whatever deveria respeitar. Está na molécula de água, faz parte da vida – O2. Indiscutível? O fato real é que governador filiado ao chefe sabia que faltava e o quanto faltava, mas acreditou que o bicho Covid ia se amedrontar talvez com a grossura e falta de educação costumeiramente machistas com que a sociedade convive. “Dá um carteirada no Covid, pai”! “Diga ao Covid quem manda aqui, pai”! Porque não é assim que funciona? A estupidez suprema: “Quem manda sou eu” abre portas machistas imaginárias, enquanto a sociedade de verdade está cada vez com mais medo da estupidez que circula online.
Chegamos então à explicação logorreica final: Precisamos confinar teatro e cinema, mas o resto vai ter proteção e pode abrir à vontade. Os jogadores de futebol saem das mansões que alugam para o réveillon e vão se abraçar e beijar à vontade diante de suas torcidas online. Meio time pega Covid – que maçada, isso de novo! – gente que pode morrer, mas afinal os jogadores tem equipe técnica à prova de tudo! Até de inteligência parece. E, afinal, o chefe não é coveiro.
O que é confinar? Como se pode pedir socialmente que jovens que veem isso tudo aceitem o confinamento? O chefe não toma vacina. Pode virar jacaré se a tomar. Sem metáfora. A sua super mega blaster estupidez, seus preconceitos bizarros devem ter pesadelos com a sua casca grossa virando o couro de um jacaré, no mínimo.
Tudo isso poderia e deveria ser uma licença poética para fazer as pessoas imaginarem um cenário de caos – não é. Estamos no meio do caos. Quem está sendo levado pela sua correnteza não sabe se vai voltar. O chefe diz que ele, “ex atleta parrudão” não pega nada e pula daí a “veterinário da ema de Brasília que deve tomar cloroquina”. Posa pra fotos junto com elas.
O seu ministro pega um avião pago com o nosso dinheiro para, ao invés de resolver a questão do oxigênio que é prioritária – respirar é prioritário até para estúpidos, certo? Vai pressionar o governador obediente a receitar cloroquina – aquela da ema de Brasilia e que não serve para nada. Resultado: Mortos pela rua e dor nacional. Dor. Creio que mesmo os mais descompassados com a vida sabem o que é dor e sofrimento. Artistas – os que o chefe chama de párias e vagabundos – pagam oxigênio, transportam oxigênio. O chefe? O chefe tira seu corpo “atlético” fora e diz que fez tudo. Que a culpa é do STF. Nossa. Sua. Dele é que não.
Moral da história: Precisamos de vacina. Nosso governo não planejou nada, não temos ações, compras, não temos sequer seringas e agulhas. Mas precisamos de vacinas. E já. Esqueçam o resto. Não querem ver nos outros estados o que vimos no Amazonas? Precisamos de vacinas. O chefe não gosta dos chineses? O máximo que eu, como chefe do chefe permito, é que ele, como represália, suspenda seu consumo de pasteis de feira. O resto é nonsense e nonsense é morte, por aqui.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
Por que as pessoas não usam máscara? Por aqui, até o catador de lixo da rua tem máscara. Porque fazem festas? Têm algo para festejar enquanto morrem crianças, adultos, idosos por falta de oxigênio? É uma aflição assistir às notícias de Manaus... Oxigênio que tem o valor de ouro, familiares vendem carros para poder comprar, doentes que dividem de 10 em 10 minutos a possibilidade de respirar... Festas? Enquanto pessoas que nem nos conhecem arriscam a sua vida para podermos ter comida, atendimento médico, resolver nossos problemas da casa, do trabalho? Porque agora a terra é plana? Alguém pisou o planeta e ele achatou? Porque não se confia na ciência? Por birra? Gastam-se milhões para especialistas da ciência resolverem problemas fundamentais do mundo e depois não se confia? E em políticos que só fazem coisas erradas já se confia? Porque fecham museus, teatros e cinemas e o apoio que dão é nenhum ou mínimo? Porque em programas de TV as pessoas estão sem máscara, com imensos convidados que entram e saem, cada vez com menos distanciamento? As pessoas já se abraçam, abraçam crianças e ficam conversando e cantando do lado da criança. Os jogadores de futebol dão abraços coletivos após cada golo. Rezamos por empates? Eles não têm filhos, pais, família? São imunes? Têm superpoderes?
Parece que meio mundo vive numa pandemia e meio mundo vive na boa, viaja, visita, curte, muda de emprego, faz negócios produtivos, leva uma vida quase normal.
Porque os atletas e atores mundialmente famosos ganham milhões e as pessoas que salvam vidas, seja em que profissão for, ganham o seu pequeno salário e já devem ficar satisfeitas? Os atores americanos ganham milhões fazendo de conta que salvam vidas. Os que realmente salvam vidas, ganham um pequeno salário. Sempre que compro legumes, fruta e verduras no mercado de uma comunidade que o dono virou amigo, lhe digo que ele é a minha saúde, a minha vida. Sempre que algum profissional precisa vir aqui em casa, por causa de canalização, eletricidade, filtro da água, etc, lhe peço desculpa por ter trocado a gentileza da água e do café, por sacos para os sapatos e gel para as mãos. Eles são a minha salvação. Merecem milhões. Todos os dias.
O que importa afinal? O que é mais importante?
No meio deste caos, presidentes que amuam e não querem sair do cargo, que passam férias enquanto o seu país se afunda, candidatos presidenciais que falam mal do seu povo. Como se fala mal de um povo e se deseja ser presidente desse mesmo povo?
A pandemia não é um teste para os corajosos ou destemidos. É um pedido do planeta para recuarmos, para mudarmos, para respeitarmos e cuidarmos do outro, cuidando-se. De cada vez que vem uma onda, tudo fica pior. O confinamento está virando apenas uma palavra. O sofrimento e a falta de ar infelizmente não são palavras. Se não aprendemos isso agora, fica difícil nos apelidarmos de “humanos” e sobrevivermos a todas as coisas erradas que continuamos a fazer cegamente e apenas pensando em dinheiro, em vaidade, em poder... Que Deus, seja quem ele for para cada um, nos perdoe um dia de toda a irresponsabilidade...
Ana Santos, professora, jornalista