“MANSPLAINING, MANTERRUPTING, BROPRIANTING” Bug sociedade
MANSPLAINING – machos nos explicando o óbvio, como se fôssemos debilóides, MANTERRUPTING – homens que não nos deixam participar da conversa, nos interrompendo sem parar, BROPRIANTING – machos que conversam com a gente num cantinho e depois repetem o que dissemos, se apropriando da nossa ideia. Cada vez mais palavras novas pra gente dizer: CHEGA, CAVALHEIROS!
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O machismo, cada vez mais, me embrulha o estômago. É algo que já não suporto mais nem ver de longe, nem ouvir falar, mas todo dia vemos uma forma nova de atacar o gênero feminino. É que não é de hoje, é de sempre. Há livros, como os de Natalie Haynes, que falam que até a ação de Perseu diante da Medusa foi pervertida, que ela não era o monstro horrível que transformava homens em pedra, mas uma mulher com poderes que foi estuprada por Poseidon e morta por ele – Perseu – que claro – aceitou que se “modificassem umas coisinhas”.
De uma maneira revoltante e covarde, vemos os machões matando crianças palestinas – como se houvesse qualquer explicação histórica tradicional enraizada que justificasse matar crianças em qualquer lugar do mundo. Matando mulheres israelenses, iranianas – estas pelo crime de usarem o véu do jeito errado – “gravíssimo”!
Os adolescentes riquinhos do Brasil, os “filhinhos do papai”do Colégio Santo Agostinho, baixam apps de IA nos seus celulares top e colocam meninas tendo que explicar em casa, olhando nos olhos de seus pais, como seus supostos nudes foram parar na internet. Como se fosse uma brincadeira de mal gosto, tipo pisar na beira do sapato pra elas olharem para trás de cara feia. Mas como pode parecer ser uma brincadeirinha expor o outro em sua fragilidade? E como, numa turma com dezenas de meninos, apenas um - (1!) – se sentiu desconfortável com aquilo? Que espécie de geração de homens está sendo criada - por geração espontânea por certo porque certamente isso não é um homem bem educado, com princípios.
E será que sou só eu que vejo esses deputados e senadores perdendo o meu tempo e principalmente o meu dinheiro com discussões absurdas como “onde as mulheres trans podem fazer xixi”, quando há jovens assediando meninas virtualmente, jovens que são menores e não podem ser presos, mas precisam ser alcançados pela lei – não essa estupidez de “onde o gênero feminino pode fazer xixi”. E se Deus tivesse que escolher entre assédio virtual de meninas de 13 anos, indefesas diante da Inteligência Artificial e onde uma mulher trans pode fazer xixi, o que esses caras insuportáveis acham que Deus escolheria? Ou então reescreveram a Bíblia para ignorantes e só eles foram avisados...
Isso é tóxico, sufocante.
Que espécie de deseducação é essa? As mães não emitem seu horror diante do que os filhos fizeram? Não há um Mea-culpa coletivo, um castigo que elas queiram nos contar – não importa o que a justiça resolva? Algo que as mulheres brasileiras possam “resolver”? Nós todas, juntas? Pra dar um chega pra lá nesses garotos insensíveis insuportáveis? Nem que seja coloca-los pra pedirem desculpas públicas às meninas – porque isso não é possível. Dizer simplesmente que “quer que o filho não sofra o que papai e mamãe sofreram e transformar pessoas em almas errantes, sem piedade, sem sensibilidade é uma coisa normal pra vocês? Então estou velha...
Nós votamos há apenas 91 anos e esses homenzinhos nanicos de princípios do Congresso querem nos tirar a oportunidade de termos cotas que nos aproximem do espaço de voto que eles – mais que usurparam – sentaram em cima, na Câmara e no Senado? Ou eles acham que as mulheres do Brasil são abobadas?
Trans mortas como se fossem pó, esposas mortas como se fossem pó, crianças assediadas pelos “espertelecos” da nova geração como se fossem pó, gays mortos como se fossem pó, o gênero feminino inteiro apartado e violentado como se fosse pó... Que nojo...
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
“Por Medusa, Não Mais” Bug Sociedade
"Instruções para viver uma vida.
Preste atenção.
Esteja maravilhado.
Fale sobre isso."
Mary Oliver
O ensino precisará das reformas, revoluções e modificações que sempre foram necessárias, mas que sempre foram adiadas. Agora não tem mais por onde fugir. Tudo ficou subitamente envelhecido, desatualizado e principalmente, ficou sem sentido. Avaliar os alunos pelos trabalhos escritos, pelos projetos, pelos TCC ou Monografias, Teses de Mestrado, Teses de Doutorado/Doutoramento, exames escritos, é avaliar o ChatGPT. A oratória, a capacidade de pensar e falar, de expressar ideias e sentimentos, confrontar oralmente pensamentos contrários com sabedoria e crescimento, encontrar soluções e resolver problemas oralmente, estas serão – já o são - mas vão ficar muito mais valiosas – as grandes qualidades, os talentos, as riquezas, o patrimônio individual de cada ser humano. E de um país. E de uma humanidade. Bug Latino já alerta para este problema desde 2012. E o problema agrava exponencialmente a cada ano. Não é utilizar palavras, mas saber utilizar as palavras. As relações entre as pessoas precisam progredir. E elas progridem quando as pessoas vão melhorando as trocas de palavras, quando buscam maior profundidade emocional, de conhecimento, de construção verbal e cognitiva, em relação ao mundo e à vida. Diferente de fofoca. Relações estagnadas não são relações – são rotinas profissionais ou familiares sem sentido emocional, sem objetivo. Durante anos podemos dizer “boa tarde” às mesmas pessoas, quando vamos passear com o cachorro. Se não passa disso, não é relação, não é nada. São apenas sons. Em 2022, um professor de uma Universidade pediu trabalhos a 50 alunos e percebeu que quem fez esses trabalhos não foram seres humanos – não havia falhas, erros, gírias. Frases diretas, todos muito semelhantes. Estava a avaliar 50 trabalhos da IA – inteligência artificial – escritos pelo ChatGPT. Veja a notícia aqui. Vamos continuar a fazer de conta que não vemos?
E se de repente lhe dissesse que os animais, afinal, também têm a capacidade de imaginação? Pois é. Se ler esta notícia, ficará espantado, mas era bom que além de espantado, também ficasse atento. Um dia destes, no passeio que faz com o cachorro, quem sabe, os cachorros param e conversam – se é que não conversam já – enquanto você repete a mesma frase em 30 anos: “boa tarde”. Nosso corpo é muito obediente em relação à lei do uso e desuso – o que se utiliza - melhora, o que não se utiliza - caduca, envelhece, avaria.
Medusa. No mínimo intrigante. Um assunto muito importante para o gênero feminino e muito desconfortável para o gênero masculino. A história que conhecemos diz que Medusa era mortal, se achava mais bonita do que Atena, teve relação sexual com Poseidon. Atena que não tolerou tamanha vaidade e “situação” transformou seus cabelos em serpentes/cobras e quem olhasse diretamente para ela se transformava em pedra. Foi decapitada por Perseu. Aqui está a escultura/estátua famosa. Natalie Haynes, graduada em Filologia Clássica pela Universidade de Cambridge, na Inglaterra, e considerada uma autoridade mundial em literatura clássica, nos conta uma outra versão. Uma outra versão não só em relação a Medusa, mas a outros mitos, referindo, por exemplo, que nunca existiu uma caixa de Pandora. Quando muito, Pandora teve uma garrafa ou pote onde - uns escreveram que - tinha coisas más ou - outros escreveram que - tinha coisas bonitas. Mas no caso de Medusa o choque tem outro nível. Natalie Haynes afirma: “As pessoas pensam em Medusa como o monstro arquetípico, mas ela foi vítima de estupro. Ela foi primeiro estuprada por um deus masculino (Poseidon) e depois punida por uma deusa feminina (Atena) por ter sido agredida sexualmente em seu templo.” Leia um artigo aqui e outro aqui, para ter tempo de digerir tudo e saber mais pormenores. Se for do gênero masculino, ao ler isto, talvez pense que é um exagero, ou que as mulheres agora justificam tudo com estupro ou abusos. Mas se for do gênero feminino percebe que finalmente são conhecidos outros pontos de vista. O ponto de vista das vítimas, das pessoas invisíveis, das pessoas que apenas tinham – e têm - de ficar de boca calada. Veja aqui a nova escultura/estátua de Luciano Garbati. Todos têm direito a expor o seu ponto de vista. Penso muito em Medusa e na justiça que se tenta fazer com seu nome e sua vida. Gosto de pensar em todas as Medusas que um dia, cedo ou tarde, serão “justiçadas”. É fácil difamar. Sei muito bem disso. Gostaria até de saber menos do que sei. Mas também sei que não se pode esperar por ninguém, muito menos por pessoas do gênero masculino para nos ajudarem a melhorar as versões da história, a dar um maior equilíbrio ao que realmente aconteceu e acontece na vida de todos. E, é com lamento que o digo, também não se pode contar com todas as pessoas do gênero feminino. Ainda não perceberam que lhes colocaram duas palas/antolhos nos olhos. Em outros tempos alguns “podiam tudo”. Não mais.
Ana Santos, professora, jornalista
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