
“EU PERDI ESSA FALA DE JESUS” Bug Sociedade
O problema das religiões não é o pecado em si, mas é manipular para apontar quem são os “pecadores da vez”. Assim, as mulheres são sempre pecadoras. O homem estupra? É porque a mulher provoca. A mulher se traumatiza e vai em busca do aborto do crápula que marcou seu corpo e seu espírito pra sempre? Tem que ser vista como assassina. O pastor estuprou? O padre é pedófilo? Aí abafa.
O problema das religiões não é o que diz a Bíblia, mas o que interpretam que está ali. Assim, Eva nasceu da costela do Adão e por isso as mulheres precisam se submeter aos desejos do marido. Senão... da traição ao abandono, à separação, a culpa é da mulher: que mentiu ao dizer que tinha dor de cabeça, quando marido – pobre “santo” marido - queria sexo.
Sexo, sexo, sexo.
Aos maridos, tudo.
Se eles traírem e assim caírem em pecado, portanto, a culpa é das mulheres.
E tomem por mulher todo o gênero feminino. Mulheres trans – pecadoras. Homens trans – homens falsificados. Gays – efeminados = “mulherzinhas”. Lésbicas – mulheres não satisfeitas, por não terem achado o homem certo. Ou seja, o problema é a falta de “machos”.
É cansativo isso.
Jesus resgata Madalena, valoriza o gênero feminino. Os ministros de Deus “pulam” essa parte, ao pregarem que, antes de terem uma filha formada na universidade, com diploma, se for pra pecar, é melhor que ela venda picolé na garagem de casa. Obediência então é melhor que conhecimento. Mas o que é pecar? É polícia matar pobre pelo pecado de serem pobres e isso ser tão dantesco que eles – os policiais – acabam por se suicidar? Isso também é devidamente “pulado”.
Nem vamos à questão das culpas...
Nem vamos à questão de que quando um homem abandona uma mulher grávida dele, sem nenhum cuidado ou apoio, isto também é um aborto – claro que dos “totalmente permitidos”.
Os homens e seu mundo machista por acaso já pensaram que na década de 60, Alan Turing, o gênio inventor do computador, aquele que descobriu o código ENIGMA que venceu os alemães na II Guerra (que tinha o nome de seu primeiro amor – Christopher) se suicidou por lhe terem tirado tudo, apenas por ser gay?
Os gays não poderiam ser gênios? Os gênios não poderiam ser gays? Em que Bíblia? Em qual mandamento?
Sexo, sexo, sexo.
Não seremos muito mais abstratos que um corpo? Etéreos, espirituais, evolutivos? Em quê a vida do seu vizinho gay super legal (que pode gostar de jardinagem, cozinha ou whatever) afeta a sua?
A falta de percepção para o pecado dos homens machistas heteronormativos – o pecado de estuprar, o pecado de abandonar sem nenhum apoio ao seu filho naquela gravidez, o pecado da pedofilia – são pecados? Talvez pecados mais graves ainda? O pecado de preservar os “machos” de seus pecados é pecado? Talvez mortal?
Os homens que pensem e concluam porque este assim, precisa continuar sendo assim.
Eu apenas estou exausta de ver a mesma coisa, travestida de coisas diferentes, com palavras diferentes.
Preconceito é preconceito. Então não ao preconceito.
Exige esforço. Sim, e daí?
Comecem, senhores.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
“A energia do cérebro” Bug Sociedade
O São João, na cidade do Porto, em Portugal é considerado o mais famoso do mundo. Aqui, na Bahia, as Festas Juninas são consideradas as melhores do mundo. Ambas são incríveis, mas como sabemos qual é a melhor? E como sabemos qual a melhor do mundo? E o que isso interessa? Para o turismo e para a economia, interessa muito, dar nomes, criar categorias, vencedores, porque ganham milhões com isso. Mas o que ganhamos com isso, nós?
Sabemos que o cérebro categoriza assuntos para economizar energia, mas porque a sociedade faz o mesmo? O cérebro precisa de ser guiado pelo nosso bom senso para decisões mais sensatas como tratar todas as pessoas com respeito, dar valor a ambas as festas de São João, amar os diferentes carnavais, por exemplo. O ser humano não ganha nada em se comparar com os outros. Ele precisa de se comparar a si mesmo, todos os dias, com a intenção de ser melhor hoje do que foi ontem. Essa a mais importante comparação, a que suscita melhoria, bem estar, boas relações com os outros, progresso. Todas as outras comparações, tendem a criar lados, a criar divisões, distâncias e facilmente constroem confrontos de ideias, conflitos, problemas, guerras, fome, destruição.
“Alan Mathison Turing foi um matemático, cientista da computação, lógico, criptoanalista, filósofo e biólogo teórico britânico” - trecho retirado do Google. Ficou conhecido pelo filme “O Jogo da Imitação” onde acompanhamos a evolução da sua invenção – o que se pode considerar como o primeiro computador. Com essa máquina, foi possível terminar e vencer a segunda guerra mundial, descodificando as mensagens com que o inimigo comunicava. Turing parecia ter alguns comportamentos que hoje são identificados no síndrome de Asperger – por exemplo, não utilizar ironia nem cinismo na forma como se comunica com os outros. Que bom que era se todos fossemos assim. Especialista em decifrar códigos, não entendia porque as pessoas falam uma coisa, querendo dizer outra. Era para ele estranho e deveria ser estranho para todos nós. Porque falamos de forma criptografada uns com os outros? É, Alan Turing, somos animais estranhos mesmo. As pessoas sorriem para quem detestam e são rudes com quem amam. Dizem que se deve ser educado, apesar daquela pessoa ser um traste. E que, com as pessoas que se ama, podemos ser o que somos, podemos ser e comportar de acordo com o nosso verdadeiro “Eu”. Bela coisa esse nosso “Eu”, sim senhor. Somos camuflados, fingidos, artificiais. Falando como Turing, somos falsos. Não percebemos que quem mais se prejudica, não são os outros não. Somos nós. É isso aí. Inseridos em camadas e camadas de “faz de conta”, de “educadíssimos”, de pessoas “impecáveis”, mas sem nenhum conteúdo, nenhuma contribuição de valor para a humanidade.
Dúvida do que falo? Basta você ficar sem nada, ou ficar muito doente, ou muito incapaz, ou enfrentar o sistema, para perceber como está só. Como estamos todos sós.
Alan Turing fez algo monstruosamente importante para a humanidade, mas por ter comportamentos diferentes e descobrirem a sua homossexualidade, foi excluído, isolado, desprezado, obrigado a fazer uma “terapia de combate à sua homossexualidade”. Esses medicamentos tiraram-lhe a rapidez de raciocínio, anestesiaram-no. Tiraram-lhe a vida por dentro e ele, ao final de um ano de “tratamento”, suicidou-se. Um homem que podia ter feito mais e mais pela humanidade, não o fez porque a categorização homossexual o fez “perder pontos”, “status”, respeito, numa sociedade que nem agradece a quem a ajuda.
O mesmo cérebro que permite a um homem inventar o que mais tarde se transformaria num computador, também é capaz de dividir as pessoas e determinar quem é melhor, quem tem mais valor. Isso para não gastar muita energia, como já falei. O nosso órgão mais incrível – o cérebro – também é aquele que, depois de adquirir as regras que construímos para as sociedades humanas, pode ser o mais vil dos juízes, o decisor mais frio e calculista, apenas porque dessa forma gasta menos energia. Falamos tanto das nossas preocupações com a inteligência artificial (IA), mas, sem perceber, já somos controlados, divididos, categorizados e voltados uns contra os outros por outro computador, tão perto de nós que até está dentro do nosso crânio. Somos controlados pelos nossos próprios pensamentos automatizados, condicionados pela sociedade, pela aprendizagem. Mas, como o perú que julga estar preso dentro do círculo de giz, ou o cavalo que julga estar preso com uma corda atada a uma cadeira, ou aceitamos ou recusamos. Ou obedecemos à norma e poupamos a energia do nosso cérebro, ou tomamos o controle dos nossos pensamentos.
Bom, o que seremos capazes? Ironizando, vamos deixar os “Alan Turing” construir uma forma de nos salvarmos, de novo? Ou vamos rir, zombar, desprezar, excluir o homossexual que ainda por cima tem comportamentos estranhos? E continuar a dividir, separar, catalogar, virar uns contra os outros? Não está cansado de brigar, de querer o que os outros têm? De recusar ajuda a quem precisa? Sabe com quem deve competir? Fique de frente para um espelho. A pessoa que vê...é você. É com essa que tem de competir. Essa é a verdadeira competição.
Aos outros? Que tal caminhar junto? Dar uma mão?
Ana Santos, professora, jornalista
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