“O PEPINO DA EDUCAÇÃO” Bug Sociedade
A ideia de se educar já foi o sonho impossível de muitos. No Brasil, de inúmeros. Não havia escola para todos. Mas o que não se esperava, era que a política ao longo do tempo transformasse a educação em seu Frankenstein particular, ao ponto de termos e mantermos analfabetos funcionais perambulando nas escolas, crianças que desenvolvem preconceito contra diferenças – inclusive, da idade de seus colegas – tudo isso misturado a uma ensino fundamental fraco, formação de professores escassa (já que ninguém mais quer uma profissão desprezada como essa) e um ensino médio mais do que defasado – talvez a palavra exata seja difuso ou mesmo confuso. O resultado? Crianças que são pressionadas pelo mercado, que foram ensinadas a consumir como loucas, mas que não conseguem competir porque é impossível competir assim.
Portanto, há vagas. Que cada vez menos gente acha que servem para alguma coisa. O último governo chegou mesmo a ser grotesco, com mudanças insanas – talvez profanas. Escorraçar nomes que deveriam ser cultuados virou rotina e esconder, distorcer e manipular fatos históricos deixou de ser mentira e virou explicação erudita. Aliás, até o “grupo zap” virou academia...
O fato é que as crianças precisam se alfabetizar. Enquanto os adultos discutem como, com quem, onde e de que modo, as crianças perdem esse tempo precioso. O governo passado tirou da escola tudo o que havia – até a comida. Sim, nós sabemos o que eles fizeram nos verões passados. Ano a ano.
Não vou, portanto, perder tempo falando mal daquilo que todos sabem que foi um atentado à sanidade. O Bug Latino pode ajudar.
1- As crianças estão falando pior. Também os adultos estão falando pior - e o pior do pior: eles não falam muito entre si. Sem o apoio dos adultos é impossível dominar o significado das palavras, a articulação, toda em partículas mínimas (a fonética), o sentido, a interpretação do texto falado, o que é certo ou errado na vida. Chegando com pouco domínio da palavra falada, pra quê ressignificá-la, na escrita? Se a escrita “guarda” o que se fala, se você tem pouco a guardar e por isso não compreende bem o que os “outros guardaram nos livros”, que motivos teria para dominar essa técnica, ter destreza?
2- As crianças não estão desenvolvendo o raciocínio matemático. Na prática, você vê pessoas que dependem do computador do mercado para decidirem entre o que querem e o que podem comprar. Não é o caso de saber a tabuada de cabeça, mas entender o que são as operações básicas e como usá-las na sua vida – embora saber a tabuada não custe nada.
3- As crianças estão trabalhando muito menos o corpo e habilidades estruturais como em cima, embaixo, direita, esquerda etc, na prática. Sem isso, como entender, abstrair, projetar que uma bolinha com um pauzinho para cima e à direita é d; à esquerda é b; para baixo e a direita é q e para a esquerda é g? Sem isso não há geografia – e geografia não é GPS.
4- As crianças não ouvem o suficiente em seus ambientes para entenderem as histórias, para interpretarem o que podem ou não podem. Sem isso, não há filosofia, ética, história, poesia, literatura. Não há sequer senso de justiça.
O Bug nasceu para lançar temas que podem ser levados para as escolas e compreendidos, debatidos pela conversa entre professores e alunos. Nasceu para lançar desafios online entre escolas, trocar ideias e experiências. Falar de comunicação, hoje, nos confunde porque a mídia nos faz relacionar tudo com fakenews e desinformação. Mas não. A nossa civilização caminhou nessa exata direção porque nós nos comunicamos dessa forma. Ela é decisiva no desenho do raciocínio que usamos, na nossa imaginação e criatividade, na nossa capacidade de guardar o que aprendemos. Portanto, você não quer mais discutir esse assunto e quer começar a contribuir? Indique o Bug Latino para os abrigos de idosos. Tantos pequenos não têm nenhuma figura de amor - e como simbolizamos, como temos linguagem, podemos amar um avô em Portugal, em Salvador, Angola ou Nova Iguaçu só pelo celular. Trocar experiências. Aprender. Não apenas física quântica, mas como andar de bicicleta, construir um relógio de sol, ver as horas em relógio de ponteiro, amarrar os tênis. Deixar de ser essa coisa incompreensível de “príncipe” e ser uma criança. Trocar.
O que os governos vão fazer com a educação no mundo eu não sei. Mas eu sei o que o Bug pode fazer pelas crianças, idosos e adultos analfabetos, alfabetizados, com mestrado e doutorado, aposentados – pode aproximá-los de novo da troca de conhecimento.
“Tribal”, né? Falar de novo, não dar tiro, não pular em cima dos carros quando frustrado, resolver as coisas falando, negociar com sucesso, ter domínio sobre o discurso, a palavra, o mundo!
Muito “tribal” mesmo.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
“Os dias, o tempo, a vida.” Bug Sociedade
Vivemos tantos tempos diferentes e igualmente importantes. Um “tipo” de tempo para o que é necessário fazer agora, de imediato e que ao fazer, resolvemos – limpar a casa, almoçar, mudar uma lâmpada, pagar o IPVA, etc. Uma espécie de tempo tenso porque não se pode ultrapassar datas – IPVA – ou se não almoçarmos a nossa irritação ou desorientação por falta de alimento vai atrapalhar o funcionamento do dia.
Outro “tipo” de tempo é o de construção de algo mais demorado – licenciatura, mestrado, doutorado / doutoramento, atividade física, escrever um livro, educar um filho, “combater” uma doença, etc. Em cada dia um grão, a construção não é muito visível, parece que nada se está fazendo, mas o que se faz ou não faz em cada dia, determina em muito o resultado final.
O tempo interior que é diferente em cada pessoa. Algumas pessoas demoram uma eternidade a decidir em que dia vão a determinado lugar, a mudar efetivamente comportamentos que querem mudar, a responder a e-mails ou propostas. E outras pessoas são muito rápidas nas mesmas tarefas, digamos assim. Ou, por outro lado, algumas pessoas hibernam, pairando, observando, pensando e quando partem para a ação, fazem tudo rapidamente. As outras começam mais cedo, não suportam procrastinar. Cada uma no seu tempo.
Os que gastam o tempo fazendo, com trabalhos de ação e os que gastam seu tempo pensando, organizando, criando, com trabalhos de pensamento.
Cada um com a sua importância. Coordenados são uma maravilha. Quando competem ou quando são voltados uns contra os outros complicam.
Estimular cada um a tirar o máximo de si, a melhorar, a encontrar o melhor lugar, a melhor função. Perceber onde cada um deve pertencer, o que cada um deve fazer. Pequenas coisas que transformariam empresas, escolas, governos, times, países, pessoas. Mas, e talvez um dia saibamos as razões, o que os “donos do mundo” fazem é frequentemente o contrário.
A população mundial está mais depressiva, em vez de dosar/dosear as notícias ruins, multiplicam. Em vez de colocar o cara alto num lugar onde coloca artigos nas prateleiras mais altas, é colocado, ou só encontra emprego a entregar comida numa moto pequena. O cara que é rápido é colocado num trabalho que exige lentidão. O cara que muito pensa é colocado em lugares de ação – linha de produção de uma fábrica. O cara que é muito bom professor, é colocado a coordenar os colegas – uma forma estranha de promover, dar valor ao que ele faz bem, mudando. Os alunos cada vez são mais agressivos ou necessitam de mais atenção, aumenta-se os papeis para o professor preencher para resolver. As pessoas estão cada vez mais agressivas, perigosas, criminosas, aumentam-se os alarmes, cercas elétricas, carros blindados. Que forma engraçada de tentar resolver as questões.
Um dia um amigo me contou que na empresa onde trabalhava o chefe decidiu colocar duas funcionárias que nem se falavam a trabalharem juntas na recepção. Todos os dias durante anos aquelas senhoras tiveram de trabalhar sentadas uma do lado da outra, sendo obrigadas a relacionarem-se. Tomou esta atitude porque decidiu que dessa forma iam se dar bem, era preciso resolver esse problema. Uma empresa com 5 mil pessoas, com milhões de possibilidades de tarefas uma longe da outra. Ambas ficaram doentes cedo, ambas faltaram ao trabalho mais do que seria comum, ambas se aposentaram por invalidez. Um chefe no “lugar certo”, fez algo “dar certo”. Quantas histórias conhecemos? Quantas pessoas ficam doentes mais cedo do que seria esperado? Infelizes? Mais agressivas? Mais envelhecidas? Até mais feias?
Li o jornal, assisti ao telejornal e parece que as rugas aumentaram, os ossos doem mais, sinto-me mais cansada, mais preocupada, mais derrotada. “Lugar errado”!
Ao procurar sair desse lugar que não me faz bem e ir em busca de notícias interessantes, o tenista espanhol Carlos Alcaraz, com 19 anos me pacifica. Um ser humano no “seu” lugar, fazendo o que nasceu para fazer, dedicando-se profundamente ao que sonha ser, ao que quer ser. Triste pela partida de Rui Nabeiro, mas impressionada com o que criou – o Império Delta, com o que foi e com o que fez. Um ser humano que fez maravilhas se calhar por escolher o lugar onde devia estar e no sonho que desejou. A Delta Cafés foi uma das primeiras marcas a patrocinar times de voleibol feminino, nos anos 80, em Portugal. Não é pouca coisa.
No lugar “certo” para cada um, o tempo está sempre a favor, lento ou rápido, pesado ou leve. Tudo encaixa na perfeição. De outra forma, o tempo esmaga.
É sempre “tempo” de perceber e corrigir a navegação. É sempre “tempo” de pequenas ações que podem contribuir para uma melhor navegação das pessoas com quem trabalha, com quem convive, com quem se cruza.
Ana Santos, professora, jornalista
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