Tem gente que é adotada de um jeito e gente que é adotada de outro. O jeito que me adotaram foi tão especial que resolvi vir aqui no Bug Latino e contar como aconteceu.
Quando tinha aproximadamente quatro ou cinco anos, morava na rua São Claudio n.18, em frente a famosa casa de número 17 que vc conhece. Era órfão desde os 3 anos mais ou menos e vivia com minha avó paterna, pois meu pai trabalhava no Ministério da Guerra - era auxiliar de portaria, o que hoje chamamos barnabé. Minha avó não queria assumir minha guarda e eu ficava o dia inteiro no jardim da casa. Sua tia e sua mãe vendo o meu abandono conversaram com meu pai e propuseram que eu ficasse com elas durante o dia, retornando para minha casa à noite. Meu pai no desespero aceitou. Certa vizinha então profetizou que o dia que eu dormisse na casa delas, não sairia mais de lá. Muito bem. Certo dia, quando meu pai foi me buscar à noite, chovia muito e como eu era uma criança muito fraca e doente, as duas pediram a meu pai pra que eu dormisse lá aquela noite. Meu pai relutou, mas concordou e aí eu fiquei mesmo pra sempre.
Veja bem: a sua mãe nesta época tinha seus 17 ou 18 anos. Aí chega uma criança e elas se apaixonaram por mim e eu com o tempo me apaixonei também. Eu tinha um amor, um ciúme e uma garra com a tua mãe. Na minha infância, ela cuidava muito de mim. Pra que vc tenha ideia, esta época era o pós guerra e tudo era difícil: pão, leite, carne, gêneros alimentícios – tudo era escasso. Pois ela ia para a fila de madrugada comprar estes alimentos. Portanto, tudo o que eu fizer por ela ainda é pouco, diante do que ela fez por mim.
Ah! Tem outro detalhe curioso - eu mijava na cama. Eu dormia entre a tua mãe e a tua tia. Aí eu mijava todo mundo. Elas acordavam no meio da noite, me davam banho, tomavam banho e aí a noite seguia. kkkk.
Ok, este é o começo de minha vida. Leia, reflita e veja quem realmente é sua mãe. Na próxima mensagem vou detalhar minha alfabetização, no jardim da infância da Escola Afonso Pena.
Sua mãe é que me levava ao jardim da infância. Eu entrava por volta de 7h da manhã e ela voltava ao meio dia para me buscar, porém ficava escondida para ver minha reação. Um dia percebi que ela quando me via chorar, me levava embora. Daí fiz isto várias vezes porque realmente era um amor intenso. Relembrar estes fatos para mim é voltar no tempo e recordar aqueles momentos felizes. Lembro que perto da minha escola tinham patos, cotias, pássaros, pavões.
Quando eu tinha 14 anos, sua mãe se casou e nossos encontros se limitaram aos fins de semana e depois nem isso porque ela foi morar em outro estado. Mas ainda hoje estes animais povoam o mesmo lugar, acrescidos de gatos cracudos, prostitutas etc. Afinal Centro Histórico sempre tem um ar meio decadente no Brasil, mesmo. Estive lá perto da minha escola há pouco tempo.
Minha fase de juventude e adulta dão outra história cheia de altos e baixos, aventuras, ilusões e desilusões. Faz parte.
Acredito que tenha contribuído pra alguma pessoa que esteja aí pensando que está sozinha e que isso não tem jeito. Com este depoimento, espero provar que tem. Depende de quem está passando lá fora e que tenha vontade de ajudar uma criança de 3 anos, sozinha, olhando para o nada, de dentro de um quintal...
Um fã do Bug